Relato do Brasil Ride na Chapada Diamantina

O Brasil Ride é  uma ultramaratona de mountain biking realizada anualmente na Chapada Diamantina. Foram sete dias de competição, com mais de 13.000  metros de ascensão acumulada e 580 km percorridos pela Chapada. A descrição e altimetria das etapas está aqui.

O relato abaixo é do mountain biker amador Diego Macena, que completou a prova com o companheiro de dupla Geraldo Severi Jr.

Vale a pena ler e sentir a pauleira que é a prova.

Brasil Ride- Stage 1

O Stage 1 começou na quinta-feira, as 23 horas, quando Eu, Geraldo, Vanessa e Ravelli entramos no carro rumo a Mucugê para o Brasil Ride. Foram 1.890 km rodados em 26 horas, onde toquei de SP até BH durante a madruga, parada para o Café e o Geraldo até Montes Claros e depois a parte mais sinistra, chata e perigosa, mandamos na mão do Experiente e Piloto de Caminhonetes, comandante de boleia Marcio Ravelli que tocou até depois de Brumado quase já em Mucugê, quando o sono já tava acabando com todos, a Vanessa arriscou tocar uma parte também, mas depois de cruzar com um casal de “jegues”, ela entregou pro Geraldo, que também morrendo de sono foi tocando bem na maciota até Mucugê. Viagem cansativa, aconselho a quem for fazer o Brasil Ride e for de carro, saia uns dias antes ( pelo menos 3) e vá em ritmo de férias, descansando nos locais, por que é desgastante e perigoso ( somado ao cansaço e estrada perigosa). Foi divertido e engraçado, eu tava num estado que tava vendo coisas na estrada. Não dormi as 26 horas, tinha hora que eu assustava o Ravelli dizendo que tinha caminhão na pista, as era só uma placa virada de costas. Foi foda, mas chegamos, bem mal humorados, sem dar boa noite para ninguém e fomos dormir.

Acordamos no outro cedo, a simpática cidadezinha de Mucugê já tava lotada, resolvemos girar e reconhecer o prologo para soltar as pernas presas da viagem, e fomos num pedal de 20 km. O Prólogo é curto porém técnico, muito técnico, algo que eu nunca tinha feito nada parecido na minha vida, pedras e mais pedras, pedras prá CA$@%¨. entramos lá o Ravelli já sumiu, Vanessa também. Ficou eu e o Geraldo lá meio perdidos e se perguntando “Será que vai ser tudo assim?” Galera, o negocio é cabeludo. O Prólogo serve já para separar a nata do leite e do fundo do copo, alguns já quebraram lá mesmo e não largaram no restante dos dias. Fizemos o reconhecimento e fomos retirar o Kit de Sobrevivência. Uma puta mala Shimano, uma necessaire chiquérrima verde limão, Adesivos, pulseira e a placa, bacana! O próximo passo era pegar a barraca que iriamos ficar, fomos até a pousadinha que estávamos hospedados, arrumamos a mala ali mesmo, separamos o que não íamos levar e deixamos na caminhonete e tocamos para Arena.

No dia seguinte era tudo novo, os preparativos para largar no prólogo, encher carmanholas, roupa, ferramentas básicas. Éramos o número 90. As largadas começaram as 13 horas com 2 duplas de 1 em 1 minuto. Deu tempo de ver a largada do Avancini com Sherman, Yamamoto e Sausser, Ravelli e May, tudo bonito de se ver, aula pros olhos e cada vez mais largadas que você via mais a adrenalina aumentava. Era espetacular. Quando chegou nossa vez, eu me embolei um pouquinho com o Garmin, sai alguns “milissegundos” atrasados depois da bandeirada. Apesar disso, largamos bem. O Geraldo liderou a ponta e entrei no vácuo de uma outra dupla. Ficamos intercalados e seguimos assim na parte de asfalto. Era bonito! A gente pedalando a uns 35 km/h, fazendo bastante força ! Saímos bonito na foto… Assim que saímos do asfalto para entrar no trecho cabeludo, a gente já mandou uma “Valeu galera, boa sorte” e tiramos o pé , os caras (Dupla 89) sumiram e demos risada, “pelo menos na foto a gente saiu na frente” … Fomos na nossa tocada, melhor do que o reconhecimento (muito melhor mesmo). Estavámos bem, desempenho técnico bom, mas com uns 10 km de trilha, aconteceu o que já aconteceu comigo outras vezes. A corrente estourou. Tipo cabaçada de “fraldinha”. Só deu tempo de gritar “Geraaaldoooooooooo, vem arrumar”. Ele veio, com toda paciência do mundo, arrumou, errou o elo duas vezes ( fiquei com a corrente pequenininha o BR todo), metemos o Power Link e tuchamos o pé de novo. um pouco mais pra frente comprei um terreno lindo! No areião. Consegui cair na única pedra que tinha, zuuouu o pé do frango, meu joelho deu aquela ralada bonita, mas foi só levantar e tocar novamente, quando a 2 km para chegar o Geraldo Fura o Pneu (1 de 15), olhamos um para o outro e falamos, vamos terminar correndo por que não vale apena parar e remendar. Correndo, o Geraldo ainda ganhou um copo de cerveja de uma pessoal que tava assistindo, virou o danado prá dentro e foi assim que chegamos com o tempo de 1:36:33 – Posição 88 de 96 na Open. Chateados ? Não. Tem mais 6 dias para recuperar o “tempo perdido”.

Brasil Ride – Stage 2

Levantamos as 3:45. Aquela voz clássica dizendo – “DIEGOOO” já tinha sido dita, O Lúcio Alves já falando alto, em 15 minutos tocou a sirene de Despertar.

Já trocando de Roupa, aquela correria danada, vai tomar café, faz o descarrego no banheiro Químico, separa ferramentas e comida para etapa. Aquela ali era a mais famosa de todas, o Tal do Vietnã tava chegando.

Bike revisada, O Geraldo tinha trocado o Pneu que tinha rasgado no dia anterior no prologo por um X-King Protection afim de não ter mais problemas com furos, essa era uma etapa longaaaaaa, e quanto menos imprevistos tivéssemos melhor.

Largamos as 6 horas. Os primeiros 15 km eram de asfalto, a Galera tudo alucinada, os pelotes andando forte e ali era a oportunidade de fazer um inicio de prova bom, andar junto com a Galera ali era ganhar tempo para o dia e fazer render o começo de prova. só que Forçamos demais (Eu forcei) os batimentos não baixavam, eu tava na casa dos 170 bpm e eles não baixavam de jeito nenhum …. mas eu sabia que ali não era hora de tirar o pé, por que precisávamos de roda no inicio para fazer o dia render. e assim fomos pulando de pelote em pelote, quando a gente tava bem, a gente pulava para outro, até que encontramos a dupla “Sushi com Pão de Queijo” e ficamos com eles até o fim do Asfalto, Brunão passeando puxando o pelote, quando ele saiu para direita e mandou eu passar, eu disse pra ele, “Eu vou, mas não espera muita coisa” KKKKKKKKKKKKKKK … O Fabio Hossaki tava se segurando, então o Brunão ficou para esperar e eu e o Geraldo mantivemos o ritmo e tocamos, acabando o asfalto entramos numa estrada larga e limpa para o pedal, algumas costelas de vaca no caminho mas grande parte limpa e deu para manter um ritmo bom, nos pegamos sozinhos, olhamos para frente e para trás mas não tinha ninguém para dar uma “roda” pra gente, então o jeito foi segurar um pouco e tocar em frente. U pouco depois avistamos um pelote, e o Gerado disse, bora grudar lá ! apertamos o passo, quando de repente o Pelote CAI ! uns 4 pro chão, se tivéssemos uns 100 metros para frente a zica seria grande! uma caminhonete do resgate tava no visual e já encostou e tomou conta da situação, Tocamos em frente, ainda era umas 7 da manha, a chuva acabou e o sol começou a aparecer, o dia seria looooongoo e cansativo. Bom, começou os Single’s Track, de todos os tipos, Rápidos, Longos, Pedras e Areão, Técnicos e não Técnicos, Legais e Chatos,essa etapa de 145 km foi duca galera, teve de TUDO ! teve até 7 pneus Furados do Geraldo ( sim, 7 pneus, ele vai abrir uma borracharia aqui em SP, horas em projeto comprovada) perdemos um bom tempo, mais de 1 hora de perrengue fácil. Bom, entramos no Vietnã com mais de 5 horas de Prova e 60% dos pneus furados, nossa prova estava apenas começando, aquele portal dizendo “Welcome Vietnã” é mas assustador por foto, tem um puta Lago na frente, o Geraldo aproveitou para dar um Tibummmmmmmmmm na Aguá para Refrescar, eu também joguei umas águas na cara e passamos pelo temido portal. No começo era técnico, impedalável mais a frente tinha um single limpo onde pedalamos uns 2 km assim, até o Geraldo Soltar “Cara, to até com medo de falar mas, isso aqui tá fácil demais”. Ele poderia ter ficado calado. Começou o perrengue. Pedra, desce da bike, Bike no ombro, sobe pedra, desce pedra, bike no chão, sobe na bike, pedala 3 vez, desce da bike, bike no ombro, desde pedra, bike no chão, empurra bike, bike no ombro, sobe pedra, desce pedra, sobe pedra, sobe outra pedra, pula atoleiro, desce varias pedra, bike no chão, sobe na bike, acha que vai passar na pedra pedalando, cai, passa raiva, da risada, levanta, passa pela merda da pedra, bike no chão de novo, pedala 2 vez  desce da bike, bike no ombro, atravessa 3533 pedras, bike no chão, pedala 4 vez, desce da bike, sobe na pedra, desce da pedra, atravessa a outra pedra de lado, atravessa o atoleiro, bike no chão, espero a Dupla, pergunta de tá tudo bem, sobe na bike, pedala 3 vez, desce da bike, bike no ombro atravessa pedra, bike no chão, pedala 1 vez  Fura Pneu, conserta pneu, pneu não enche … e assim foram 17 km não tão sofridos por que não estava tanto calor (pingou algumas vezes no Vietnã), mas foi sofrido, desgastante pelo empurra e desce da Bike, saímos de lá com tempo para o ultimo corte ainda, estávamos bem, mas ai tinha uma PAREDE para subir na chegada para Rio de Contas ! Eu e o Geraldo sempre Juntos, sem discussão, um sempre respeitando o outro, sem um largar o outro para trás (muitas duplas brigaram, andaram separadas e de um dia para o outro se separaram definitivamente) Vencemos Aquela Etapa e principalmente o Tal do Vietnã! Chegamos com 11:13:43 – Subimos para 76 de 96 cansados mas satisfeitos com os resultados! A Próxima Etapa era o XC ! Onde poderíamos andar soltos e mostrar tudo que sabíamos e podíamos ! 

Brasil Ride – Stage 3

Bom, depois da paulada do dia anterior (145 km + o Vietnã) era dia de XC ! – Para quem não tá familiarizado, XC nada mais é que um Circuíto montado para que a gente fique dando voltas e mais voltas (Cemucam é um, para quem vai lá brincar de vez em quando). e nesse dia era o único dia que a dupla não precisava andar juntos, ali era cada um por si e Deus por todos, com o padre antes do Down Hill da Igrejinha benzendo todo mundo com um pote d’água e um Ramo na mão. A Regra era 1 só! depois que o Avancini ou Yamamoto (favoritos) fechasse a 5a Volta, ninguém podia abrir outra.
Pois bem, eu e o Geraldo estávamos alinhados que “Precisávamos nos preservar, pois no dia seguinte tinha mais 82 km na lomba”, que tudo era bem técnico, que ali poderíamos colocar tudo a perder ( uma queda nas rochas poderia ser fatal para Bike e para nós)

E “Agente FOI”, Largamos já na nossa cabeça que só seria possível dar 3 voltas antes dos ET’s fecharem as 5 volta.

Já começava em subida, todo mundo saiu igual loucos buscando campo, com alguns Km de prova logo um “estreitamento de pista” no qual todo mundo desceu da bike e começou a xingar. e estavam todos lá. Guto, Chris, Geraldo … e O Sausser lá na frente, o cara deu Sorte de verdade ! se não fosse aquele beco congestionado ele tomaria bucha de todos nós, pois ai seria nossa vingança pelas pelo menos 3 horas que ele colocou na gente no dia anterior. Passou o beco, mas o congestionamento não acabou, seguimos em Single até uma subida Bruta e chata, ali sim deu uma dispersada na galera até a hora que entramos em outro single antes da subida da igrejinha. Aquela subida é “impedalavel”, todo mundo empurrando, e dando risada, por que não tinha o que fazer. No topo da subida tava o Tal padre “Bezeno” a galera antes do Down Hill da Morte. passei, levei a benzida, o Geraldo já tinha passado na minha frente e pediu um Gole da Água pro Padre, claro que o cara não deu né, ia ficar feio o Avancini tomar bucha de um Engenheiro Aeronáutico. Me deparei com aquela descida de “Predas”. Feio, galera. Todo mundo descendo da bike e torto para empurrar, com as pernas tremendo.
Eu tava confiante, olhei pra frente, vi o negócio cabeludo, mandei um que se foda na mente e desci, desci bonito ! Muita gente tirando foto, muita gente gritando para abrir pra mim… show show show …. aquele momento deveria ser eternizado.

Acabou a descida cabeluda, em seguida vem uma menos cabeluda porem rápida …eu tinha passado o Geraldo na de pedras e ele me passou lá no final desta rápida, depois de um riozinho, igual um cavalo, esse manda bem nas passadas fortes. Desceu da Bike e mostrou pra que veio. Logo em seguida depois dele me passar eu tentei grudar nele mas não deu. nossas diferenças das voltas foram todas 1 minuto para ele. Ele tava subindo forte em todas e eu tirava diferença no Down Hill da Igreja no qual ele tava empurrando, apesar de Andar separados nossos fortes/fracos são bem “balanceáveis”. Dupla perfeita! Conseguimos fechar as 3 voltas os dois e aquele dia saímos da posição 76 para 65 na Geral.

Não da pra deixar de citar aqui como é bonito ver a Elite andando. Avancini e o Yamamoto deram 2 voltas em mim, quando eles passavam ele sumiam! o Avancini sempre da Roda do Yamamoto como tática. Lindo Lindo. Na última volta, no DH, eu dei uma paradinha para deixar o Sherman passar, ele “voou” pelas pedras !!! Os caras ANDAM MUITO! 

Brasil Ride – Stage 4

Depois do XC do dia anterior, conseguimos descansar bem, era meio dia já estávamos lavando a Bike e guardando para o dia seguinte.

A cidade de Rio de Contas é muito show de bola, tranquila, onde os jovens ainda não são viciados em internet e formam seus grupinhos de encontro na praça. Aqueles dias todos estavam de bike ! desde as meninas até as crianças pequenas, acho que a professora trocou o “Dia do Brinquedo” pelo “Dia da Bike” para prestigiar a prova. A galera lá é tão inocente que me pararam umas 5 vezes para tirar foto e dar “autógrafos” na camisa e em folha de caderno, hilário mas ao mesmo tempo me senti importante em fazer feliz as crianças que possuem um pouco de carência!

Aí beleza, banhados, Jantados, dormidos (bem dormidoo, bem dormidoo), acordamos cedo para o outro dia, dia QUENTE, QUENTE ! Dizia Rafael Campos no Briefing do dia anterior, e dizia também que o percurso era de 82 km com os pontos de Hidratação no Km 38 e 58. Subidas duríssimas, quente prá Ca@%#. Eu e o Geraldo estávamos bem. Largamos no ritmo de sempre, administrando tudo, até passar as marchas para conservar o equipamento. A primeira subida dura já tinha passado, já tínhamos terminado o single track gigante até o apoio do Km 38, quando de repente, no Km 37 não tinha a placa de “Água em 1 km” … é não tinha, tinha uma placa escrito assim: HÁ PEGADINHA DO MALANDRO! YEI YÉ ! HU ! SAUSIFUFU !

Todo mundo xingando, a gente tava subindo, subindo, subindo até o céu quase, e nada do ponto de apoio, você olhava em volta e só tinha mato, nenhum lugar que “desse” para colocar um apoio. quando finalmente no KM 48 estava lá, aquela água bonita, fresca e molhada! para encher as nossas caramanholas quase vazias e molhar nossos corpos quase podres. Muita gente ali ficou sem água, 10 km de subidas, no sol de mais de 45 graus faz muita diferença! Um atleta amador que administra bem sua água, ficar 1 hora e pouco sem água é fatal ! O cara quebra não só fisicamente como psicologicamente.

Ok, superado a primeira mancada da Organização, quando no Km 58 (ponto de apoio number 2) nós estávamos num single track muito louco. Ali somente o Tarzan conseguiria ajudar a gente de alguma forma. Tá ai, o Geraldo começou a fazer umas comparações com o mapa da altimetria, e chegou a conclusão de que tava TUDO ERRADO! Onde estávamos descendo, no mapa era pra tá subindo, no Km 71 (acho) tava o ponto 2. Como sempre ninguém sabe de nada, ninguém sabia informar o que tava acontecendo.

E nesse apoio, quem estava sentado com cara de Desolado ? Luis Pinto. Extra Terrestre, campeão de várias edições do Brasil Ride, o cara que coloca pelo menos 5 horas em todas as etapas em todos nós seres humanos. Ele e o parceiro dele, de cabeça baixa e quietos. Eu perguntei: – Luis, o que aconteceu ? E ele disse, “Meu câmbio quebrou”, Olhei para Bike tamanho XXL do Alienígena e realmente ela estava sem seu cambio, sem gancheira, sem corrente, sem nada.
Bom, ali eu pensei 2 coisas:
– CHUPA, VOCÊ TOMOU BUCHA !
– POR QUE VOCÊ NÃO REMENDOU A CORRENTE NUMA MARCHA FIXA PARA PELO MENOS TERMINAR A PROVA ? (no estilo barra forte)

Bom, ai que existe a diferença do cara que vai para terminar e para o cara que vai para ganhar. O cara que vai para ganhar não anda com gancheira reserva, por que se a bike dele quebrar ele não vai mais conseguir ganhar mesmo, então para ele é TUDO OU NADA. O cara que vai para terminar, ele tem uma segunda bike no mochila. Vai chegar em último, mas vai ser Finisher ! Isso tá no sangue do amador.

Passado ali, tinha uma subida FEIA, MAIS FEIA ! E quando passamos pelo Mario Roma e o Rafael Campos, descobrimos a terceira pegadinha do dia: HÁ A PROVA VAI TER 20 KM A MAIS!

Cara, o sangue subiu. E já veio na cabeça que no dia seguinte teria mais 92 km e no outro mais 145 km e no outro 67 km e no outro 1,800 km para voltar para São Paulo … Mandei um foda-se internamente e pensei: O que é um peido pra quem tá cagado.

Bom, terminamos, dentro do tempo de corte oficial, mas naquele dia não teve corte, muita gente quebrou por causa das mudanças, a galera regrada na tática de guerrilha se ferrou legal com todas as mudanças. Massssss foi mais um dia show, sofrido e duca! Paisagens lindas, uma puta vale animal com umas pedras brancas. Show show show!

Brasil Ride – Stage 5

Já acordei com medo de abrir a barraca e encontrar o Serginho Malandro gritando HÁ PEGADINHA DO MALANDRO, HOJE SÃO 200 KM! Era um dia duro de novo para as pernas, que já tinham pedalado 287 km e subido 6.900 metros acumulados. Eu e o Geraldo adotamos a tática de todos os dias, tática do “devagar e sempre”, pois no outro dia tinha que voltar para Mucugê, uma miséria de 145 km novamente.

O briefing no dia anterior foi engraçado, todo mundo fazendo piada com os 20 km a mais. Uma coisa que achei bacana foi a sinceridade da organização. O Rafa disse que não sabiam o que tinha acontecido, explicou como é o processo de marcação da trilha para todos detalhe por detalhe, para saberem realmente o que aconteceu eles precisavam aguardar a equipe que já estavam fazendo a marcação do 5° dia volta e que a única foi que eles poderiam fazer naquele momento era pedir desculpas para nós, foi aplaudido por todos! Taí, souberam reconhecer que deu merda e colocaram o peito na frente.

Voltando ao 5° dia. A largada era as 8 da manha. Bastante protetor, aquele Hipoglós no rabo, por que já tava ficando assado e realmente difícil de sentar no selim. Dor pra tudo quanto era lado. Todo procedimento matinal tava pronto. Bike lubrificada por mim (a Squirt sumiu com a lubrificação, os caras só lavavam), bike revisada pela Shimano (serviço de ponta, Anjos Azuis foram nomeados). Café da manhã pra dentro (ovo, muito ovo, ovo mesmo!, pão, calabresa e suco).

A sessão de descarrego mudou. Acho que por tanta correria e pelo fato de estar tomando café 30 minutos antes de largar, não a corpo humano que faça essa digestão tão rápida. Então, a sessão de descarrego já tinha sido alterada para o dia anterior de noite, de manhã tava vazio vazio.

Sempre 30 segundos para largar, os caras colocavam uma música para tocar (Seal – Get It Together). Essa música entrou pra minha cabeça, quero depois colocar ela no meu celular para tocar como despertador todas as manhãs, pra sentir a sensação de estar pronto para guerra todos os dias! Por lá, nós estávamos de corpo e alma prontos para a guerrilha em todos os sentidos! Então largamos! Os ETs já saiam esprintando, fomos no nosso ritmo, forte de início, mas se preservando. Naquele dia, a prova subia até o primeiro ponto de apoio, com descidas fortes !! Ah, eu tinha trocado também a pastilha do dia anterior depois do briefing. Eu estava com pastilhas de resina e a traseira estava menos que da metade. Fiz bem em ter trocado, bastante descida forte, a pastilha de resina nova gastou metadinha. Se eu tivesse ido com a velha e usada com certeza eu teria que parar para trocar. Logo chegou a primeira subida chata antes do apoio no km 38. Subida forte que não acabava nunca! Chegamos no ponto de apoio e foi o ritual de sempre, descatar toda água que tem no corpo para refrescar, completar as caramanholas de água e isotônico, beber mais isotônico, beber mais água, beber coca-cola, coca-cola, coca-cola. Manda as balinha de açúcar pra dentro e muita bolacha salgada! e depois mais coca-cola de novo, pra ajudar a descer tudo. Sinceramente se eu fize-se isso num dia normal eu passaria mal, mas lá deu certo ! Eu saía do apoio inteiro. com isotônico misturado com coca-cola com minhoquinhas de açúcar e bolachas sal, banana e melancia.

Ai despencamos numa descida boa! Até mais ou menos no 50 km, que tinha uma parede fudida!! Prá xingar bastante o Rafael Campos e o Mario Roma. Passamos por dentro de várias cidadezinhas e bairros, todo mundo curtindo muito a corrida, estendendo a mão para cumprimentar quem estava correndo.

A galera que for correr o Brasil Ride, antes de cumprimentar aquelas 15 crianças enfileiradas, avalie o olhar de cada uma delas. 2 entre 10 crianças vão dar um puta tapa na sua mão! Se vc não cair ou deslocar o ombro vc vai ficar uma dor de verdade, sempre tem uma criança má! Em todas as cidades desse Brasil.

Aquele dia a gente tava bem, em um dos barrancos o Geraldo tava com uma calibragem baixa no pneu dianteiro, ele perdeu a pressão na hora. Ali começou uma novela:

– Coloca Co2, o pneu não enche.
-Tenta o segundo cilindro de Co2. Nada.
-Usa câmera do Geraldo: Ok ! Vamos em Frente.

Alguns metros pra frente o Geraldo descabelou pra frente, numa estrada de cascalho. Ali eu tomei um capote que só deu tempo de gritar “Geraldooooooooooooooo” .. Nada. Passou uma menina por mim dizendo, “pode deixar que eu aviso ele”. Eu, cheio de coragem, disposto a enfrentar tudo no Brasil Ride! levantei e continuei. Logo em frente tinha um precipício de pedras não sinalizado, num topo sem visão. Quase foi o terreno comprado, segundo do dia. Consegui segurar e manobrar nas pedras. Quando avistei meu querido parceiro Geraldo Severi Jr parado, disse a ele.

-Véio, caí ! Feio.

Geraldo:

– É, eu sei, a moça avisou, mas olha meu pneu murchou.

Ele não tava esperando o companheiro caído dele, ele tava com o pneu furado mesmo.

Foi aí que desmontamos novamente a roda, mas o problema era na válvula dela. Aí eu disse: “Cara, usa a minha, vamos que tamo ficando sem tempo”. Foi aí que escutei um barulho feio e um cara: “Meuuuuuuu Deussss!. E “Ele voouuuu. Você tá bem meu amigo?? Você tá bem ??”

Era o Fábio Hossaki, decolando no precipício de pedras não sinalizado, um japa de quase 100 kg de puro músculo e brutalidade, fez o chão tremer e assustar todo mundo. Peguei minha caramanhola e fui la acudir o camarada. O bicho tava sem ar! Com uniforme rasgado no peito! foi de peito no chão! Graças a Deus não passou de um susto.

Voltando ao pneu furado, emprestei a minha câmara para o Geraldo. Revisei ela na mão e encontrei um furo (esperto eu, meu Deus, antes de montar o pneu). Remendei, “Santo Vipal nessas horas”. Revisei de novo. Outro Furo ! Novamente Vipal na câmara , remendo feito. OUTRO FURO! Aí o Geraldo – Que porra é essa ? Lembrei que eu tinha guardado na bolsa junto com a câmara 2 agulhas para costurar um pneu em caso de emergência…. Resumindo, só naquela câmara foram 4 furos. Bom, terminado a reconstrução da roda, passou um anjo por nós ! Vanessa Cabral! Quando tinha acabado os cilindros de Co2, ela nos emprestou uma bomba de Ar e zarpou fora! Conseguimos resolver aquela questão! Depois de quase 30 minutos parados. No final do single tinha um ponto de apoio, onde encontramos o Fitipaldi em desistência com uma costela doendo muito. O Geraldo encostou a bike e fomos nos hidratar, na volta adivinha ? Pneu murcho. DE NOVO MEU DEUS ? POR QUE COM A GENTE DE NOVO ? MAIS DE 200 BIKERS E TUDO CONCENTRADO NA GENTE ? Aquele era O PNEU 14 de 15.

Com muita calma, desmontamos, lavamos, revisamos, passamos cola nos remendos de novo. montamos e partimos. No segundo apoio da Shimano o Geraldo pegou uma câmara e um pneu com eles, eles montaram e utilizamos para terminar o dia! Sem mais problemas!

Chegamos no Apoio da Red Bull bom bastante folga, a lata tava CHEIA AINDA!!!! MANDAMOS RED BULL PRA DENTRO! Tiramos fotos, demos algumas risadas e partimos para última subida do dia. a Serra das Almas, onde você deixa sua alma no meio dela de tanta força que você faz.

Pois bem, eu e o Geraldo começamos a subir e uma coisa que fizemos que ajudou muito a gente ali, não só no ritmo como no psicológico, foi associar aquele momento aos nossos treinos. A Serra das Almas é aquele asfalto famoso das fotos do Brasil Ride, onde tem aquela cachoeira puta visual! Ela tem 4 km de subida parede e mais uns 3 alternando falso plano com plano. Logo olhamos um pro outro e dissemos, “Bora que essa é a última Aldeia da Serra”. Aldeia da Serra é uma serra que tem aqui em SP, são 6 km de subida forte. A gente costuma dar 2, 3 voltas na trilha e subir por ela. Isso deu um gás! Foi como se a gente tivesse terminando mais um treino bem ! Chegamos em Rio de Contas com 8 h e 12 minutos, felizes e cansados, correndo para agilizar tudo e descansar o quanto antes para o realmente “Grande dia”. O Vietinã ficou fichinha perto desde dia.

Nota: o Diego parou de atualizar o relato. 😦

9 pensamentos sobre “Relato do Brasil Ride na Chapada Diamantina

  1. Parabéns! tanto pela prova,quanto pelo ótimo relato que muito ajudará nós “reles mortais” que pretendemos concluir esse desafio futuramente! (ansioso pelos próximos capitulos.) forte abraço. Toninho de manaus AM

    • Leandro, tenho duas notícias para você. Uma boa e uma ruim. 🙂

      A boa é que o Diego finalizou bem o Brasil Ride. A ruim é que ele parou de fazer o relato. 😦

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