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Frase do autor contra “história de bicha” prejudica promoção de Velho Chico

Mauricio Stycer

13/03/2016 05h01

A campanha de lançamento de "Velho Chico", próxima novela das 21h da Globo, sofreu um baque na noite de segunda-feira (07), quando Benedito Ruy Barbosa falou a jornalistas: "Odeio história de bicha".

O preconceito do autor da história provocou as mais variadas reações – de crítica, ironia e apoio. Para a emissora, a polêmica não foi positiva. Ao longo de toda a semana, a estreia da novela ficou em segundo plano. Em vez de falar sobre "Velho Chico", os comentários foram sobre a frase de Benedito. Não foi uma boa promoção para a trama.

No esforço de atenuar a rejeição criada pelo autor em alguns ambientes, o diretor da novela, Luiz Fernando Carvalho se manifestou, criticando a posição de Benedito. O neto do autor, Bruno, procurou dar um contexto à declaração. E Aguinaldo Silva, que não tinha nada a ver com o assunto, tentou tirar uma casquinha.

Abaixo, um resumo da polêmica.

Benedito Ruy Barbosa, autor da história de "Velho Chico": "Odeio história de bicha. Pode existir, pode aceitar, mas não pode transformar isso em aula para as crianças. Tenho dez netos, quatro bisnetos e tenho um puta orgulho porque são tudo macho pra cacete. Não sou contra, não acho errado. O que acho é que quando eu tenho na mão 80 milhões assistindo minha novela, tenho que ter responsabilidade com as pessoas que estão me assistindo. Tenho que saber que tem muito pai que não quer que o filho veja, porque eles não sabem explicar, não sabem como colocar. Muita gente reclama disso para mim. O que não é justo é você transformar: só é normal o cara que é bicha, o que não é bicha não é normal. A mulher que é sapatona é perfeita, a que não é sapatona não é legal. É assim que estamos vivendo".

Jean Wyllys, deputado federal (PSOL-RJ) e ativista: "As declarações homofóbicas e deselegantes de Benedito Ruy Barbosa durante o lançamento de "Velho Chico" – nova novela das 21h da TV Globo – podem ser interpretadas como mais uma manifestação do embate entre o antigo e o novo: entre a velha ordem social, com seus preconceitos, hierarquias e opressões, defendida por conservadores e reacionários, e a nova ordem social que nasce da ampliação dos conhecimentos humanos e do repertório cultural, da mobilidade social, da paulatina inclusão de outros atores sociais e temas na esfera pública e da superação de velhas injustiças."

Luiz Fernando Carvalho, diretor de "Velho Chico": "A declaração do Benedito não corresponde ao meu pensamento nem ao pensamento de toda minha equipe, incluindo aí os autores, Edmara e Bruno (filha e neto de Benedito) além de todo o elenco. Foi um momento muito infeliz. Repudio firmemente toda forma de preconceito. A novela fala de amor, inclusão e lutas por direitos de igualdade e justiça. Sinceramente, não posso entender como um escritor tão sensível possa ter chegado a este ponto".

Aguinaldo Silva, autor de novelas: "'Odeio história de bicha', proclamou Benedito Ruy Barbosa. Isso teria a ver com alguma traumática história de sofá em priscas eras? Sem essa de boicotar 'Velho Chico', sou contra. Afinal, a sobrevivência financeira de três gerações da família Ruy Barbosa depende dela"

Bruno Barbosa, neto e coautor de "Velho Chico": "Eu leio esse discurso dele de uma forma menos rígida do que como pode ser ouvida. Acompanhando, lendo, e pelo que eu conheço da obra do meu avô, a maneira como ele trata de uma transgressão, como foi o caso da reforma agrária em 'O Rei do Gado', ele foi a fundo no tema e acho que, no discurso dele, o que sobra pra mim é não tocar em algo que ele não tenha a ciência e o conhecimento profundo pra discutir. Então, talvez não seja… é um universo que não compete a ele. Agora, quando você começa a discutir com ele sobre o Velho Chico, essa sensibilidade familiar da discussão, das grandes gerações, é um tema que ele domina."

Rodrigo Lombardi, ator, viverá o capitão Ernesto Rosa em "Velho Chico": "Não acho que seja nenhuma afronta, é só uma opinião. As pessoas têm que aprender a aceitar um pouco mais a opinião alheia. Benedito é um homem do campo, de raiz. Então não esperem tamanha polidez. Ele é culto, letrado, maravilhoso. Mas ele exprime a opinião do jeito que ele exprime. Vamos ter um pouquinho mais de humor, o Brasil está precisando disso."

"Velho Chico" estreia nesta segunda-feira (14). Nas redes sociais, houve até pedido de boicote à novela por pessoas ofendidas pela declaração de Benedito. Os números de audiência darão uma ideia do impacto desta polêmica.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.