CAVALCANTI,
Tenório
*dep. fed. RJ 1951-1964.
Natalício
Tenório Cavalcanti de Albuquerque nasceu em Bonifácio, no município de Palmeira dos Índios
(AL), no dia 27 de setembro de 1906, filho de Antônio Tenório Januário
Cavalcanti de Albuquerque e de Maria Cavalcanti de Albuquerque, pequenos
proprietários rurais. Descendente de Francisco Alves Cavalcanti Camboim, barão
de Buíque, deputado provincial em Pernambuco de 1835 a 1837, seu pai pertencia a um ramo empobrecido de poderosa família nordestina. Outro parente,
seu padrinho Natalício Camboim de Vasconcelos, foi industrial em Alagoas
e deputado federal pelo mesmo estado de 1909 a 1926.
Iniciou os estudos em Palmeira dos Índios mas, órfão de pai
aos 12 anos, viu-se obrigado a contribuir para o sustento da mãe e dos irmãos.
Algumas fontes afirmam que seu pai morreu de doença, e outras que foi
assassinado numa das inúmeras rixas ocorridas no violento sertão alagoano. De
qualquer modo, com a morte do chefe, a família se desfez das propriedades e
Tenório passou a trabalhar como empregado em fazendas de compadres e parentes,
inicialmente na serra da Mandioca e depois em Quebrângulo (AL).
Em
1926, com muito pouco dinheiro, transferiu-se para o Rio de Janeiro, então
Distrito Federal. Trazia uma carta de apresentação de seu padrinho, a qual, no
entanto, pouco o auxiliou. Hospedado em pensões humildes ou em casas de
parentes no subúrbio, trabalhou como lavador de garrafas na cervejaria Brahma,
servente, copeiro e ajudante de enfermeiro no Hospital dos Marítimos,
garçom de pensão, porteiro de hotel, empregado em loja de roupas e motorista de
caminhão. Ao mesmo tempo, matriculou-se no Ginásio Guanabara.
Fixação em Duque de Caxias
Em 1927 ocorreu o fato que determinou o rumo de sua vida: foi
convidado a administrar uma fazenda em Duque de Caxias, à época parte do
município de Nova Iguaçu (RJ). O proprietário das terras, Edgar de Pinho, era
cunhado de Otávio Mangabeira, então ministro das Relações Exteriores, e
necessitava substituir um empregado assassinado em conflito pela posse e demarcação
das glebas. Na ocasião, a construção da rodovia Rio-Petrópolis, cruzando o
território caxiense, provocava a valorização dos terrenos, em boa parte ainda
não saneados e cobertos de pântanos. Consta que Tenório teria prestado ajuda à
construção da estrada, fornecendo materiais.
Como administrador da fazenda, Tenório envolveu-se em
sucessivos choques armados, com saldo freqüente de mortes e feridos, e viu
prosperar sua fama de pistoleiro de boa pontaria. Acusado de envolvimento em
tiroteios, conheceu nesse período sua primeira prisão, em Petrópolis (RJ),
tendo sido libertado por força de habeas-corpus.
Devido
provavelmente a suas ligações com a família Mangabeira, em 1932 forneceu uma
tropa de mulas para os rebeldes constitucionalistas de São Paulo. Em seguida,
quando Edgar de Pintho arrendou suas terras a uma empresa alemã dedicada à
exploração de madeira, carvão e lenha, Tenório continuou a servir à fazenda. Na
época, destacou-se na repressão a uma greve de trabalhadores que se
transformara em rebelião. Sem deixar o emprego, foi adquirindo terras
encharcadas fadadas a valorizar-se anos depois, quando se concluísse o
saneamento da Baixada Fluminense.
Pela
mão do político local Getúlio de Moura — mais tarde deputado federal e seu
adversário — filiou-se à União Progressista Fluminense (UPF), em cuja legenda
elegeu-se em 1936 vereador à Câmara Municipal de Nova Iguaçu, representando o
distrito de Duque de Caxias.
No ano anterior, seu partido fora derrotado nas eleições para
o governo do estado do Rio pelo candidato do Partido Popular Radical, o
almirante Protógenes Guimarães, apoiado por Getúlio Vargas. Desse modo, na
Câmara Municipal, Tenório se situava na oposição tanto ao governo estadual
quanto ao federal. Exerceu o mandato de vereador até o advento do Estado Novo
(10/11/1937), que suprimiu todos os órgãos legislativos do país. Seu
oposicionismo, entretanto, não impediu que, ainda na vigência do regime
ditatorial, fosse aprovado em concurso e nomeado agente fiscal em Duque de
Caxias.
Ao
longo desse período esteve envolvido em tiroteios que produziram grande número
de vítimas, provocados, segundo afirmaria mais tarde, a mando do delegado
Joaquim Façanha, adversário político que derrotara nas eleições. Num desses
entreveros, foi atingido por vários tiros e hospitalizado. Antes, contudo,
matou seu atacante. Pouco tempo depois, o delegado Façanha foi assassinado no
interior de um trem e Tenório, acusado do crime, recolhido à Casa de Detenção.
Novamente beneficiado por um habeas-corpus, refugiou-se em Alagoas.
De volta ao Rio, deparou-se com nova ordem de prisão, sendo
recolhido à penitenciária de Niterói, onde passou 42 dias. Libertado,
reinstalou-se em Duque de Caxias, retomando sua trajetória pontilhada de
choques armados e episódios de violência. Atribuía esses conflitos a Ernâni
Amaral Peixoto, interventor federal no estado do Rio durante todo o Estado Novo
(1937-1945), e ao secretário de Segurança Agenor Barcelos Feio. Em diversas
ocasiões, afirmou que as cicatrizes de bala — mais de 40 — distribuídas por seu
corpo haviam sido obra dos “pistoleiros do senhor Amaral Peixoto”. O
antagonismo entre Tenório e o interventor foi duradouro, e marcou a política
fluminense, especialmente na década de 1950.
Deputado federal
Com a erosão do Estado Novo e a criação dos partidos
políticos em 1945, Tenório filiou-se à União Democrática Nacional (UDN),
tornando-se ardoroso partidário da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes à
presidência da República. José Eduardo Prado Kelly, um dos líderes de seu
antigo partido, a UPF, era agora um vulto eminente da UDN e o político mais
próximo do candidato udenista.
Em
1947, Tenório foi eleito deputado à Assembléia Constituinte do estado do Rio na
legenda da UDN, e em outubro de 1950 elegeu-se para a Câmara dos Deputados com
a quarta votação entre os candidatos udenistas fluminenses.
Durante a legislatura iniciada em 1951, intensificou ao
máximo seu combate a Vargas e Amaral Peixoto, que no mesmo pleito haviam sido
reconduzidos à presidência da República e ao governo do estado do Rio. Da
tribuna da Câmara, uniu-se aos udenistas que acusavam o governo de conceder
favores financeiros ao jornal Última Hora através do Banco do Brasil,
alinhando-se a todas as demais campanhas antigetulistas da época.
O nome de Tenório, que residia agora em uma casa fortificada
— conhecida como “fortaleza” — em Caxias, ganhou nesse período ampla
repercussão nacional, devido ao seu envolvimento em vários incidentes
sensacionais. No primeiro deles, o delegado de polícia de Duque de Caxias,
Albino Martins de Sousa Imparato, foi assassinado em agosto de 1953.
No dia 25 de agosto, Tenório e o prefeito do município, seu
aliado, participavam de uma cerimônia cívica na cidade, quando sofreram um
atentado a tiros — praticado, segundo Tenório, a mando de Imparato, agente do
governo estadual no município com quem cultivava uma profunda rivalidade havia
mais de dois anos. Tenório teve seu chapéu varado por uma bala. Três dias
depois, aos primeiros minutos do dia 28, o delegado e um investigador que o
acompanhava foram atingidos por uma rajada de metralhadora no interior de um
veículo no centro de Caxias.
Imediatamente
acusado de mandante do crime, Tenório se viu ameaçado de prisão pelo coronel
Barcelos Feio, que retornara à Secretaria de Segurança do estado. Entretanto,
quando a polícia fluminense pretendeu invadir sua residência, a UDN lhe prestou
solidariedade, enviando os nomes mais destacados do partido para uma vigília no
interior de sua “fortaleza”. Tenório ficou em liberdade, apesar de sua prisão
preventiva ter sido decretada em diversas comarcas, e nada ficou apurado no
inquérito instaurado para esclarecer o assassinato.
Outro episódio que contribuiu para sua notoriedade foi o
patrocínio da defesa do tenente-aviador Jorge Alberto Franco Bandeira, acusado
de matar Afrânio Arsênio de Lemos, cujo corpo foi encontrado no interior de um
automóvel na rua Sacopã, no Rio, em 6 de abril de 1952. Tenório havia-se
bacharelado pela Faculdade Nacional de Direito, do Rio, e além da defesa de
Bandeira atuou como advogado em diversas causas criminais.
Através da maciça cobertura da imprensa, o chamado “Crime do
Sacopã” foi acompanhado com interesse por amplos setores da população. Tenório
promoveu uma intensa campanha pública em defesa do tenente Bandeira,
argumentando que os mandantes do crime seriam na verdade parentes de altas
personalidades do governo Vargas. Em 1954, embora jamais se tenha admitido
culpado, o tenente Bandeira foi condenado a 15 anos de prisão, dos quais
cumpriu a metade, obtendo depois livramento condicional.
O prestígio de Tenório, que já vinha em ascensão,
multiplicou-se a partir de fevereiro de 1954, quando fundou no Rio, juntamente
com Hugo Baldessarini, o diário Luta Democrática. Desde a criação, o
jornal associou-se à movimentação comandada por Carlos Lacerda, integrando-se à
campanha antigetulista cujo recrudescimento acabaria conduzindo Vargas ao
suicídio (24/8/1954). Adotando uma linguagem popular e valendo-se de apelos
sensacionalistas, como o recurso a manchetes ambíguas que ficaram famosas, a Luta
Democrática conquistou grande aceitação junto às camadas mais pobres da
população carioca e fluminense, difundindo a imagem de Tenório sempre envolto
em uma vasta capa preta que escondia a metralhadora apelidada
“Lurdinha”, da qual nunca se separava. O jornal publicava diariamente a coluna
“Escreve Tenório Cavalcanti”, na qual o deputado defendia sentidas
reivindicações populares. A fama de Tenório cresceu, como o evidencia o filme Carnaval
em Caxias, lançado em 1954, no qual o personagem Honório Boamorte,
representado por José Lewgoy (na época o mais conhecido vilão do cinema
nacional), inspirava-se ostensivamente em sua figura.
Em virtude de todos esses fatos, Tenório foi consolidando sua
liderança política em Duque de Caxias, nas áreas vizinhas da Baixada Fluminense
e no então Distrito Federal, o que se traduziu nas eleições de outubro de 1954,
quando foi reeleito deputado federal na legenda da UDN com a maior votação do
estado do Rio (42.060 votos).
Ligado
ao setor mais radical da UDN, Tenório apoiou o governo de João Café Filho e
opôs-se ao movimento de 11 de novembro de 1955. Liderado pelo general Henrique
Teixeira Lott, ministro da Guerra até a véspera, o levante provocou a deposição
dos presidentes Carlos Luz, em exercício, e Café Filho, licenciado. Lott e seus
seguidores alegaram que a iniciativa teve o objetivo de deter uma conspiração
golpista em preparo no governo e assegurar a posse do presidente eleito, Juscelino
Kubitschek. Nessa ocasião, da tribuna da Câmara, Tenório acusou o general Artur
da Costa e Silva, então comandante em Caçapava (SP), de trair o grupo militar a
que estava ligado e aderir às forças de Lott.
Manteve-se
na oposição durante todo o governo Kubitschek, combatendo a política
desenvolvimentista e a construção de Brasília, além de denunciar repetidas
vezes a corrupção oficial. No período, participou das “caravanas da liberdade”,
com as quais Carlos Lacerda percorreu o país quando lhe foi vedado o acesso ao
rádio e à televisão. Lacerda relembrou mais tarde que, nessas campanhas,
Tenório “entusiasmava as massas, contando aquelas histórias e com aquela
capa... Afinal, era a primeira vez que ouviam um sujeito da UDN falando feito
matuto e com ‘ar de povo’.” Segundo um de seus auxiliares da época, “Tenório
era o verdadeiro PTB dentro da UDN”.
Ao mesmo tempo, não deixava de cultivar seu eleitorado
caxiense. Em 1958, por ocasião das enchentes que assolaram o município,
distribuiu terras aos flagelados e auxiliou-os na construção de novas casas.
Ainda durante o governo Kubitschek, sua metralhadora, arma de uso militar, foi
apreendida pelo Exército. Desde então, encontra-se no Museu do Batalhão de
Guardas, no Rio.
No pleito de outubro de 1958, repetiu seu feito eleitoral,
sendo novamente reconduzido à Câmara com a maior votação do estado (46.029
votos). Seu eleitorado, entretanto, crescera apenas 10% enquanto entre 1950 e
1954 aumentara mais de quatro vezes. Começou então a afastar-se de Carlos
Lacerda, numa conjuntura em que amplas massas urbanas se deslocavam para a
esquerda.
Em
1960, nas primeiras eleições para o governo do recém-criado estado da
Guanabara, Tenório deixou de lado a Baixada Fluminense e lançou-se na cena
política carioca, candidatando-se ao cargo na legenda do Partido Social
Trabalhista (PST). Obteve o terceiro lugar, com pouco mais de duzentos mil
sufrágios (23% dos votos válidos), resultado decisivo para propiciar a vitória
de Lacerda, que derrotou por pouco mais de 20 mil votos o petebista Sérgio
Magalhães, apoiado pelas correntes nacionalistas e de esquerda. Muitos anos
depois, o próprio Lacerda admitiu esse fato: “...eu ganhei a eleição porque o
Tenório, candidatando-se, pegou votos na favela e os tirou do Sérgio
Magalhães.”
Durante
o efêmero governo de Jânio Quadros (1961), Tenório combateu a abertura para os
países socialistas, então encetada sob a égide da “política externa
independente”. Com a renúncia de Jânio (25/8/1961), apoiou a posse do
vice-presidente João Goulart, inicialmente vetada pelos ministros militares e
só ocorrida no dia 8 de setembro, depois da instituição do regime
parlamentarista de governo.
Líder
do PST na Câmara a partir de março de 1962, em outubro do mesmo ano Tenório
candidatou-se ao governo do estado do Rio, apoiado pela coalizão do PST com o
Partido Trabalhista Nacional (PTN). Na campanha, em que a Luta Democrática teve
participação crucial, acolheu com veemência os grandes temas do governo de
Goulart, batendo-se pelas reformas estruturais e contra o capital estrangeiro —
assim como já havia apoiado na Câmara a Lei da Remessa de Lucros, aprovada em
1962. Trabalhou em conjunto com Leonel Brizola, candidato a deputado federal
pela Guanabara na legenda do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), e contou com
o apoio do então semilegal Partido Comunista Brasileiro (PCB), cujos candidatos
mais ostensivos ao Congresso se abrigavam na legenda do PST.
Em seus pronunciamentos de candidato, denunciou incisivamente
o governo de Carlos Lacerda, acusado de reprimir manifestações populares, e
procurou identificar-se junto ao eleitorado com a herança de Vargas.
Qualificava seu principal adversário, o petebista Badger Silveira, de
malversador do pensamento trabalhista, do qual dizia ser ele, Tenório, o único
representante genuíno. Em mensagem publicada na Luta Democrática às
vésperas do pleito, afirmou: “Não se assuste o sr. João Goulart, se é que ele
deseja o trabalhismo puro que Pasqualini sonhou, que Getúlio sempre aplicou...
Sou eu quem luta abertamente contra os grupos econômicos imperialistas. Sou eu
quem enfrenta agentes do imperialismo, como o sr. Carlos Lacerda e outros
encapuzados.” De fato, embora sempre tenha sido adversário político de Vargas,
Tenório nunca deixou de ser identificado, no seio de seu eleitorado, à figura do
ex-presidente: ambos eram tidos como “amigos dos pobres”. Capitalizando sua
fama de pistoleiro, estampava na Luta: “Cariocas, da trincheira
fluminense acertarei o alvo... matarei a fome que está ceifando vidas de irmãos
brasileiros.”
As
urnas, entretanto, deram a vitória a Badger, com 260 mil votos contra 224 mil
de Tenório. Os demais candidatos — Paulo Fernandes, Miguel Couto Filho e Edmundo Macedo Soares — tiveram votações menores. Como em 1960 na Guanabara, Tenório
afirmou que as apurações foram fraudulentas e proclamou-se o verdadeiro eleito.
Teve de contentar-se, porém, com um mandato de deputado federal conquistado no
mesmo pleito, na legenda de uma coligação do PST com o Partido Socialista
Brasileiro (PSB) e o Movimento Trabalhista Renovador (MTR). Teve menos da
metade dos votos conseguidos em 1958 e foi o segundo colocado da legenda,
encabeçada por Demistoclides Batista, apoiado pelo PCB.
Na Câmara, Tenório se manteve na liderança do PST,
tornando-se em 1963 vice-líder e depois líder do bloco dos pequenos partidos.
Seu jornal apoiou resolutamente o comício de 13 de março de 1964, promovido
pelas forças nacionalistas e de esquerda com a participação do presidente
Goulart, e desfechou duros ataques ao Instituto Brasileiro de Ação Democrática
(IBAD), que desenvolvia intensa ação oposicionista financiado, segundo seus
acusadores, por capitais estrangeiros.
Na noite de 31 de março de 1964, após o início do movimento
político-militar que iria depor o presidente da República, Tenório dirigiu-se
ao palácio Laranjeiras, onde se encontrava Goulart. Embora testemunhas do
episódio afirmem que tenha ido solidarizar-se com o presidente ameaçado,
Tenório, anos depois, assegurou ter ido ao palácio no cumprimento de missão que
lhe fora confiada por José de Magalhães Pinto, governador de Minas Gerais e
líder civil do movimento de 1964: a de dissuadir Jango do suicídio, pois os
conspiradores temiam que o presidente se sentisse inclinado a repetir o gesto
de Vargas, pondo por terra, tal como em 1954, toda a articulação.
De todo modo, uma vez implantado o novo regime, teve seu
mandato cassado e seus direitos políticos suspensos em 13 de junho de 1964,
apenas três dias depois de ter assumido na Câmara a vice-liderança de um bloco
parlamentar de seis partidos pequenos e médios, encabeçado pelo Partido Social
Progressista (PSP). Mais tarde, Tenório atribuiria sua punição à inimizade que
lhe votava o novo ministro da Guerra, o general Costa e Silva, desde os idos de
1955.
Afastado da cena política, Tenório recolheu-se a seu reduto
eleitoral, passando a maior parte do tempo em seu sítio de Gramacho, localidade
do município de Duque de Caxias. Manteve contudo os vínculos com a população
caxiense, sustentando uma obra filantrópica de vulto: a Fundação São José e o
Colégio Maria Tenório. A Luta Democrática ressentiu-se da marginalização
do proprietário e foi declinando, com tiragens cada vez mais reduzidas, até ser
arrendada em 1973 a um grupo de jornalistas encabeçado por Raul Azedo. No final
de 1977, o jornal esteve a ponto de deixar de circular, sendo editado apenas
esporadicamente. Em 1980, porém, retomando a antiga tradição das manchetes
escandalosas sobre ocorrências policiais, recuperou parcialmente o prestígio de
que desfrutara nos primeiros dez anos de existência.
Tenório manteve alguma ligação com os governos posteriores a
1964, inclusive através de seu genro, Hydekel Freitas Lima, deputado federal
pelo estado do Rio na legenda governista da Aliança Renovadora Nacional (Arena)
entre 1975 e 1982 e, mais tarde, senador entre 1990 e 1995. Em novembro de
1978, participou de uma recepção ao então presidente eleito João Batista de
Oliveira Figueiredo, em visita a Duque de Caxias.
Em
janeiro de 1979, retornou ao noticiário ao assumir a defesa do ex-policial
Mariel Mariscot de Matos, acusado de homicídios e apontado como integrante do
“esquadrão da morte”, organização ilegal que se notabilizou pela execução
sumária de elementos considerados criminosos. Em dezembro do mesmo ano,
manifestou a intenção de voltar à atividade política em defesa do presidente
Figueiredo, que considerava “a última solução para o país”.
Em 1982 tentou retornar à política, quando cogitou lançar sua
candidatura ao Senado, mas acabou desistindo. No pleito de novembro desse mesmo
ano, apoiou a candidatura de Wellington Moreira Franco, do Partido Democrático
Social (PDS) — sucessor da Arena —, ao governo do Rio de Janeiro, que acabou
derrotado por Leonel Brizola. No pleito de novembro de 1986 apoiou a candidatura
de seu neto Fábio Tenório, que concorreu a uma cadeira na Assembléia
Legislativa do estado na legenda do Partido Democrático Trabalhista (PDT), mas
não se elegeu.
Afastado definitivamente da política, Tenório Cavalcanti
continuou dedicando-se às atividades da Fundação São José, a qual mantinha um
conjunto habitacional com cerca de dez mil pessoas, com aluguéis baratos, uma
escola para cinco mil crianças e vários cursos profissionalizantes.
Faleceu no Rio de Janeiro no dia 5 de maio de 1987.
Era casado com Valquíria Lomba Cavalcanti, com quem teve
quatro filhas. Outro de seus genros, Getúlio Gonçalves, presidiu a Associação
Comercial de Duque de Caxias. Seu primo Joaquim Tenório Cavalcanti foi vereador
e prefeito da cidade.
Arlindo
Silva publicou as Memórias de Tenório Cavalcanti segundo sua narrativa
(1954). Vários folhetos de cordel também trataram de sua biografia em verso,
como o de Serra Cardoso, História de um bandido que se tornou deputado
(1953), ou o de Zé Alagoano, Vida, paixão e drama do deputado Tenório
Cavalcanti, publicado na Luta Democrática a partir de fevereiro de
1954.
Em 1984 foi publicado o livro Tenório, o homem e o mito,
de autoria de sua filha Maria do Carmo Fortes. Em 1986 foram lançadas mais duas
obras sobre sua vida: O homem da capa preta, filme de Sérgio Resende, e Capa
Preta e Lurdinha (dissertação de mestrado), de Israel Beloch.
Israel
Beloch
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