Maia e Alcolumbre evitaram comprar briga com Bolsonaro para não impulsionar atos

Gesto contraria líderes partidários, que esperavam resposta mais incisiva dos presidentes da Câmara e do Senado

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Brasília

A cúpula do Congresso decidiu evitar um embate público com o presidente Jair Bolsonaro na mais recente crise política com o Executivo. O gesto contraria apelos de lideres partidários.

Um dos objetivos é não insuflar manifestações marcadas para 15 de março nem ampliar ataques que o Congresso tem sofrido de grupos de direita. Na pauta dos atos estão bandeiras contra o Legislativo e o Judiciário.

O assunto foi tratado na quarta-feira (26) entre os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) - Pedro Ladeira-12-nov.19/Folhapress

Os dois têm pedido cautela a deputados e senadores no esforço tanto de evitar dar munição a grupos bolsonaristas como de não serem os principais alvos das manifestações.

Alcolumbre, que retorna de viagem no domingo (1º), tem mantido interlocução com integrantes do Planalto e manifestou a aliados a intenção de se reunir com Bolsonaro no início da semana.

Na terça-feira (25), o presidente compartilhou vídeo que convoca a população a ir às ruas para defendê-lo.Na  quinta (27), fez novas críticas ao Congresso, que voltaram a ser avaliadas como graves por líderes partidários.

Por trás das críticas, há a disputa entre o Executivo e o Legislativo sobre o controle do Orçamento.

O silêncio de Alcolumbre e a mensagem considerada branda do presidente da Câmara, segundo avaliação feita pelos próprios aliados do deputado, surpreenderam o Palácio do Planalto. O governo receava um discurso mais firme.

Apesar da estratégia de evitar o embate, tanto Maia como Alcolumbre vêm sendo pressionados por deputados e senadores a dar uma resposta firme a Bolsonaro na pauta de votações congressual e a estimular iniciativas contra os filhos do presidente.

Alcolumbre foi aconselhado, por exemplo, a impulsionar o seguimento do pedido de cassação do mandato do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), em um processo apresentado no Conselho de Ética por PT, Rede e PSOL.

A representação cita suposta associação do senador com a milícia e a apuração a respeito de um esquema em seu gabinete, quando era deputado estadual no Rio de Janeiro.

Na Câmara, a pressão é para que se agilize a análise de duas representações, também no Conselho de Ética, contra o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

A duas medidas, na avaliação de senadores, seria uma forma de tentar impor limites aos Bolsonaro.

Maia e Alcolumbre conversaram pelo telefone após a divulgação da informação de que o presidente havia compartilhado o vídeo. Os dois concordaram, segundo relatos de aliados, que se tratava de um episódio grave e de mais um ataque.

Inicialmente, discutiram uma reação conjunta. Maia sugeriu que subissem o tom e divulgassem notas de repúdio contundentes, a exemplo de episódios anteriores.

Alcolumbre, que costuma ter posições mais governistas, não quis aderir ao apelo. Até a noite desta sexta-feira (28), estava decidido a não se manifestar.

O senador disse a aliados que o diálogo entre os Poderes não pode ser feito em uma espécie de bate-boca nas redes sociais. Maia, por sua vez, fez questão de publicar mensagem.

Sem citar Bolsonaro, o deputado afirmou que "criar tensão institucional não ajuda o país a evoluir" e que "o Brasil precisa de paz e responsabilidade para progredir."

O tom adotado por Maia, no entanto, foi bem mais ameno do que o sugerido por deputados de centro e de esquerda. Eles ficaram frustrados com a declaração.

Em conversas que foram relatadas à Folha, o presidente da Câmara disse a alguns aliados que não é líder da oposição. 

Maia também indicou que a chance de dar prosseguimento a um eventual pedido de impeachment, o que tem sido defendido por partidos de esquerda, é zero.

O deputado conversou com o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, e sugeriu que houvesse uma reação conjunta e incisiva, antes de moderar o tom.

Na quarta (26), Toffoli divulgou uma nota em que não atacava Bolsonaro diretamente, mas falava que não há democracia sem um Parlamento atuante e um Judiciário independente. 

Tanto o presidente da Câmara como Toffoli e Alcolumbre têm pregado a necessidade de atuar com cautela diante do modus operandi de Bolsonaro. 

A avaliação é a de que a estratégia de criar polêmicas e depois recuar é frequente no comportamento do presidente. Por isso, é mais adequado fugir daquilo que avaliam como mais uma armadilha.

O diagnóstico é que, ao confrontarem incisivamente Bolsonaro, acabam fomentando argumentos da base bolsonarista. Esse grupo, para eles, busca elementos para dizer que o Congresso atua contra o Executivo.

Nesta sexta, Maia se pronunciou novamente pelas redes sociais. Disse que conversou com o assessor especial de Paulo Guedes (ministro da Economia), Esteves Colnago, e que "o Congresso trabalha para garantir o crescimento do país e aumentar a confiança".

"Incompreensões e turbulências não vão tirar nem o foco nem a serenidade dos parlamentares", afirmou. 

O silêncio de Alcolumbre foi avaliado como a melhor resposta por aliados do presidente do Senado. 

Para eles, instigar o embate com Bolsonaro seria cair em uma espécie de arapuca, uma vez que as polêmicas criadas por ele servem, na opinião dos senadores, como cortina de fumaça para esconder pontos fracos do governo.

A avaliação não é unânime. 

"Na vida, em especial na política, temos sempre de ter posição ou lado. Não existe espaço vago, porque, em um minuto, ele é ocupado", disse a senadora Kátia Abreu (PDT-TO).

O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), tentou conversar com Alcolumbre sobre a necessidade de uma reação, mas não conseguiu falar com o presidente da Casa.

"Não existe pauta sem defesa das instituições. É preciso defender a liberdade de expressão e evitar o desmonte da democracia. É ruim não se posicionar neste momento", afirmou Carvalho.

O presidente, nesta quinta, em live semanal nas redes sociais, cobrou do Congresso a aprovação de projetos enviados pelo governo, mas negou que tenha incitado a população a ir às ruas a protestos contra o Legislativo.

No mesmo dia, o procurador-geral da República, Augusto Aras, informou por meio de assessoria que também não irá se manifestar sobre o compartilhamento do vídeo por Bolsonaro. 

Nesta sexta, o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) afirmou que não há ameaças à democracia, mas que existe um “turbilhão”, com a divulgação de vídeos e o calor das redes sociais, que fazem com que o governo passe por momentos de instabilidade.

“Mais uma vez, destaco que os mares não estão tranquilos. Os mares não estão tranquilos porque vídeos são divulgados, redes sociais se incandescem, as pessoas muitas vezes não raciocinam sobre o que estão escrevendo e estão discutindo, emoções são colocadas à flor da pele e parece que nós vivemos num eterno turbilhão”, disse.

Colaboraram Reynaldo Turollo Jr., de Brasília, e Katna Baran, de Curitiba

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