"Violência institucional"

Presidente de sindicato critica modelo de plantões de delegacias da mulher

Autor

29 de janeiro de 2019, 13h17

Uma das promessas de campanha de João Doria (PSDB), governador de São Paulo, é a implementação de Delegacias de Defesa da Mulher com plantões 24 horas. Depois de um vaivém de anúncios e decisões, o político disse, na quinta-feira (23/1), que pelo menos três delegacias da mulher (DDMs, no jargão policial) ficarão abertas ininterruptamente até o final de fevereiro de 2019.

Divulgação
Para a delegada Raquel Kobashi Gallinati, manter delegacias da mulher em funcionamento 24 horas por dia é medida eleitoreira que vai prejudicar mulheres policiaisThati Abreu

Na prática, porém, a falta de técnica e o cunho eleitoreiro da medida acabam promovendo ainda mais violência contra as mulheres, avalia a delegada da Polícia Civil de SP Raquel Kobashi Gallinati, presidente do SindPesp, o sindicato paulista de delegados de polícia.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, por sua vez, afirma que a ampliação se dará "sem qualquer prejuízo ao acolhimento às vítimas ou aos profissionais em atuação nessas unidades" (leia a íntegra da nota no final do texto).

Para Raquel, no entanto, o anúncio é uma forma de "violência institucional" contra as delegadas. O sindicato calcula que haja déficit de 13,5 mil policiais civis em São Paulo, e as delegacias da mulher poderão usar todas as mulheres delegadas que atuam no estado, entre 20% e 30% do efetivo total.

"Sem a prévia contratação de novos policiais para esse trabalho específico, a realocação dos parcos recursos humanos existentes, o regime de plantão apenas agudizará as péssimas condições de trabalho às quais já são submetidos os policiais civis", destacou Raquel em ofício enviado ao delegado-geral de Polícia de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes. 

À ConJur, a presidente do sindicato frisou que a gravidade da situação vai além do atendimento precário à população devido à falta de funcionários adequados à investigação das ocorrências.

"As delegadas serão coercitivamente realocadas para as novas Delegacias de Defesa da Mulher, podendo ser responsáveis, sozinhas, tanto pela gestão das unidades, quanto pelos plantões 24 horas e por todo o acervo cartorário", argumentou destacando que nem mesmo os titulares de delegacias que não especializadas têm essas mesmas responsabilidades. 

Para Raquel, a medida é uma discriminação por gênero e um retrocesso ao direito e igualdade da mulher, uma vez que a carreira das delegadas paulistas, que já estão sofrendo assédio moral, ficará totalmente à mercê da atuação nas DDMs. "Além de uma sobrecarga muito maior de trabalho, as delegadas não poderão escolher onde atuarão", diz. "As mulheres estancarão a ascensão na carreira não podendo atuar em cargos como diretoria, chefia de departamentos ou até mesmo delegada geral".

"Obrigar a atuação nas DDMs sem escutar a opinião das mulheres policiais é uma forma de querer sanar uma injustiça social violentando os direitos de outras mulheres", ressaltou Raquel. "A Lei não fala em uma obrigatoriedade das vítimas serem atendidas exclusivamente por mulheres, então o Estado não pode impor que as delegadas só atuem em Delegacias da Mulher".

Ampliação será técnica, diz SSP
Em resposta às críticas, a Secretaria de Segurança Pública afirmou, em nota, que "a ampliação do atendimento nas DDMs 24h será realizada de maneira técnica e sem qualquer prejuízo ao acolhimento às vítimas ou aos profissionais em atuação nessas unidades. Os estudos de viabilidade para essa expansão estão em curso e três novas unidades entrarão em funcionamento 24 horas até o fim de fevereiro".

"Paralelamente ao atendimento nas DDMs, todas as delegacias paulistas, inclusive as Centrais de Polícia Judiciária (CPJ) que funcionam 24 horas, são capacitadas para registrar casos de violência contra a mulher. Os cursos de formação de policiais, sejam civis ou militares, contam com disciplinas especificas sobre o tema e as unidades policiais contam com o Protocolo Único de Atendimento, que estabelece um padrão para o acolhimento das vítimas dessas ocorrências.

Atualmente, estão em andamento concursos para seleção de mais 2.750 policiais, que após o término do curso serão distribuídos para todo o Estado. Além disso, os investimentos em tecnologias ampliaram o atendimento à população, possibilitando maior agilidade no registro de ocorrências, além de auxílio em investigações."

Clique aqui para ler a íntegra do ofício ao delegado geral.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!