Coronavírus

Brasil. Os quatro ministros da Saúde de Bolsonaro vão ser ouvidos na Comissão de Inquérito

Brasil. Os quatro ministros da Saúde de Bolsonaro vão ser ouvidos na Comissão de Inquérito
EVARISTO SA

Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich deverão ser ouvidos na próxima terça-feira, 4 de maio. Já o general Eduardo Pazuello, debaixo de fogo por alegada omissão no caso da insuficiência de oxigénio em Manaus, será ouvido na quinta-feira, dia 6. Marcelo Queiroga, o atual titular da pasta, será ouvido na sexta-feira, dia 7

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para escrutinar a abordagem dos governantes à crise sanitária, no Brasil, arrancou na terça-feira. Esta quinta-feira ficou fechada a convocatória do atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e dos anteriores titulares da pasta, Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello.

Mandetta e Teich deverão ser ouvidos na próxima terça-feira (4 de maio), já o general Pazuello, debaixo de fogo por alegada omissão no caso da insuficiência de oxigénio em Manaus, será ouvido na quinta-feira (6 de maio). Pazuello esteve no cargo entre maio de 2020 e março de 2021, foi um mandato marcado por recordes sucessivos no números de mortes, mas também pautado por manobras e decisões questionáveis no que toca à aquisição de vacinas ou recomendação de medicamentos sem eficácia, lembra este artigo do “G1”. A isto tudo alia-se o tal caso em Manaus, da carência de oxigénio (que o Expresso tratou AQUI).

O cenário de Pazuello ser convocado foi uma das preocupações do Presidente Bolsonaro na conversa telefónica com o senador Jorge Kajuru, publicada em meados de abril. “Se não mudar a amplitude, a CPI vai simplesmente ouvir o [ex-ministro da Saúde, Eduardo] Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana. Kajuru, você tem que fazer do limão uma limonada. Por enquanto é um limão que ‘tá aí. ‘Tá para sair a limonada.” Bolsonaro, sugerindo “amplidude”, exigia àquele senador que prefeitos e governadores fossem convocados pela CPI para diluir o peso da responsabilidade do Governo Federal, ou pelo menos dividir o foco do escrutínio.

No dia seguinte, na sexta-feira (7 de maio), será a vez de Marcelo Queiroga ser ouvido. É o atual ministro da Saúde, nomeado em meados de março, é o quarto do mandato Bolsonaro. Apesar da proximidade com a família Bolsonaro, principalmente do senador Flávio Bolsonaro (que o queria no cargo após a queda de Mandetta), Queiroga foi mostrando-se defensor da vacinação contra a covid-19, "a principal aliada", isto antes de ser nomeado. Mais: em maio, desaconselhou o recurso a cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina para combater o vírus que tem castigado o país. Num vídeo nas redes sociais, que remonta a março, defendeu o uso de máscaras para compor um lote de "medidas eficazes" para controlar a doença.

Renan Calheiros, o relator que precisou de um empurrão da justiça para ser confirmado como tal, convocou também o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, que será ouvido no dia de Queiroga, na quinta-feira (6).

De Mandetta a Queiroga

Marcelo Queiroga sucedeu na altura a Mandetta, Teich e Pazuello. O primeiro, um ortopedista, esteve no cargo entre 1 de janeiro de 2019 e 16 de abril de 2020. Em outubro, o Expresso entrevistou Mandetta, que descreveu Bolsonaro como um “Presidente de impulso”, negacionista, que revela raiva pelo "carteiro" que leva as más notícias. E disse mais: "a aposta política [de Bolsonaro] sacrificou o esforço da Saúde". Mandetta, cujo ministério chegou a ter uma taxa de aprovação popular superior à do Presidente, saiu por divergência com o Executivo, o tema da cloroquina terá sido decisivo.

Seguiu-se Nelson Teich, oncologista de profissão, que esteve no ministério entre 16 de abril de 2020 e 15 de maio de 2020. Nem um mês. Defendeu o isolamento social e chegou mesmo a propor o confinamento, algo que choca de frente com as ideias de Bolsonaro. Teich ficou isolado.

Finalmente, o antecessor de Queiroga, o general Eduardo Pazuello, liderou o Ministério da Saúde entre 15 de maio de 2020 e 15 de março de 2021. Foi nesta liderança que foi lançado finalmente, na ótica de Bolsonaro, o protocolo de tratamento da covid-19 que recomenda a utilização da cloroquina, “Um manda, outro obedece”, admitiu Pazuello certa vez sobre a ligação com o Presidente. Depois do episódio da falta de oxigénio em Manaus, o procurador-geral da República Augusto Aras pediu ao Supremo Tribunal Federal para investigar a conduta e eventual omissão de Pazuello.

A comissão

Esta CPI será responsável pelo apuramento de ações e omissões do Governo Federal durante a pandemia que já matou mais de 400 mil pessoas no país. Serão também escrutinadas as suspeitas de desvios de verbas federais.

"Não dá para discutir questões políticas em cima de quase 400 mil mortos”, disse no arranque dos trabalhos o senador Omar Aziz, eleito presidente da CPI para a covid-19. “Eu não me permito fazer isso. Eu não me permito porque infelizmente perdi um irmão há 50 dias. Eu não viria a uma CPI destas querendo puxar para um lado ou outro. Não haverá pré-julgamento da minha parte."

E acrescentou: “Esta CPI não pode servir para se vingar de absolutamente ninguém. Esta CPI tem que fazer justiça a milhares de órfãos que a covid está deixando. Ninguém de nós conseguirá fazer milagre, mas podemos dar um norte ao tratamento e ter um protocolo nacional, [podemos] descobrir coisas que deixaram de ser feitas e por quem deixou de fazer, seja ele ministro, assessor, governador ou prefeito deste país".

A CPI conta com 11 membros, sendo que apenas quatro são senadores afetos ao Governo de Jair Bolsonaro, que terá falhado na articulação de apoios para ganhar mais influência naquela comissão. Ao perder força, tentou evitar que Renan Calheiros, do MDB-AL, fosse indicado como relator, já que é considerado da oposição. A justiça foi chamada a desembrulhar este imbróglio e, depois de impedido por um juiz, Renan Calheiros acabaria por ser finalmente confirmado, o que foi visto como uma derrota do Planalto.

“Não estamos aqui para maquinar ações persecutórias, não estamos aqui diante da atenção integral da nação e do mundo para blindar, engavetar, tergiversar ou procrastinar. Tudo será investigado, como exige a carta democrática, de maneira transparente, acessível", disse na sua intervenção inicial o relator, Renan Calheiros. "O país tem o direito de saber quem contribuiu para as milhares de mortes, e eles devem ser punidos imediata e emblematicamente.”

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