Voltar Fé e velas acesas ajudam servidor da comarca de Chapecó a enfrentar e superar desafios

"Para qual santo você acendeu as velas?" Essa é a pergunta mais frequente que o técnico judiciário auxiliar Ati Pires de Souza Pires, 69 anos, passou a ouvir na vida a partir de 2006. Muitos amigos não confiavam que o condutor de máquinas pesadas com pouco estudo poderia encarar o desafio e passar no concurso do fórum da comarca de Chapecó aos 54 anos - idade considerada tardia para aqueles que escolhem a carreira pública.

"É só uma vaga, você não vai conseguir!" Essa foi outra fala de desmotivação ouvida por Ati. "Mas é só de uma vaga que eu preciso mesmo!", respondia. Deus, revela, lhe concedeu uma memória para "se defender na vida". Mesmo com a falta de apoio, Ati se organizou para estudar pelo maior tempo possível durante o dia, noite e madrugada.  

Durante a preparação, em dezembro de 2005, Ati revezou estratégias entre repetição, escrita e fixação. Chegava do trabalho por volta de 18h e seguia direto para a cama. Dormia até às duas horas da manhã. Acordava e seguia nos estudos até às 8h, quando voltava para o trabalho. No absoluto silêncio da madrugada, a concentração somente nos estudos se configurou em uma injeção de ânimo para o aspirante a concursado. Outra artimanha de Ati foi ouvir áudios no caminho percorrido no ônibus até o trabalho e recolher todos os banners de programação de filmes de videolocadoras. No lado avesso e branco, Ati escrevia em letras garrafais os principais conceitos da Constituição brasileira. "Colei no meu guarda-roupa e, cada vez que eu olhava, lia, repetia e gravava na memória".

"Vivi o fórum como se fosse minha própria vida". Aprovado para a surpresa de muitos, Ati Pires tratou de viver o sonho que parecia impossível de ser sonhado nas noites que passou em claro para estudar. Ele conta que, com o novo salário, conseguiu comprar um computador e deixar a vida de esforço manual, até então em tratores, máquinas pesadas e oficinas mecânicas. Antes mesmo de assumir o cargo, concluiu em tempo recorde a formação exigida do ensino médio.

Há 15 anos, o servidor trabalha "exatamente no mesmo lugarzinho", como ele mesmo conta. A realização profissional de Ati é encontrada nos olhos marejados durante o relato para a entrevista. Ati simplesmente não consegue falar do fórum e conter as lágrimas. "No fórum eu só fiz amigos. Mesmo que alguém passasse pelo corredor, sempre tinha um momento de sorrisos. Mas, na hora de trabalhar sério eu abaixava a cabeça e trabalhava sério", relata.

Uma das maiores alegrias do profissional foi quando completou o estágio probatório. O receio de Ati era por não ter graduação em direito, como quase todos os demais colegas, medo de não aprender e não assimilar as atividades do dia a dia. Na implantação do eproc, Ati pensou que não conseguiria se adaptar.

"Sou de uma geração que não cresceu com informática e tecnologias. Mas eu pedi ajuda. Fazia os chefes ficarem até depois do horário para me explicar, para eu treinar e aprender. E isso não impactou o meu trabalho. Sempre ajudei as pessoas, de uma forma ou de outra".

A dedicação para os estudos também consagrou sonhos antigos. Autor de dois livros - um deles premiado nacionalmente -, Ati gosta de escrever contos. Mas ele não precisa de narradores. Ati conta sua história e diz que não é exagero estar vivo pelo incentivo dos colegas do fórum. "Todos os dias eu recebo uma palavra de carinho, ânimo, conforto dos meus amigos da comarca. Sempre foi uma honra muito grande trabalhar no fórum. Para quem vivia de pisar na geada, de trator velho, tive uma vida de honra no trabalho", destaca.

Em outubro de 2020, o servidor com receio da tecnologia foi diagnosticado com uma doença rara: a dermatopolimiosite (DPM). Uma doença autoimune que causa inflamação e paralisia nos músculos. Afastado do fórum, Ati tem revezado internações no hospital com tratamentos pesados e intensos em casa. Quando precisa ir até o hospital é a prova de fogo: usa duas máscaras, luvas e jaleco. "Se eu pego Covid, é caixão!", relata. Todo o esforço é realizado para evitar ao máximo a probabilidade de contágio com o vírus letal.

Atualmente em licença para tratamento de saúde, mas já com a documentação de averbação por tempo de serviço encaminhada, Ati aguarda pela aposentadoria e acredita que não volta mais para o fórum na condição de servidor ativo. Em breve, crê, poderá aproveitar em tempo integral o conforto do lar com a esposa, Jussara, e os dois filhos, Diomar e Athos. "Ela é a gerenciadora da minha luta pela vida", diz. Devoto de santo Expedito, Ati acende as velas mais uma vez. O pedido é outro, mas a fé é a mesma.

Conteúdo: Assessoria de Imprensa/NCI
Responsável: Ângelo Medeiros - Reg. Prof.: SC00445(JP)

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