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Estudo revela novo panorama epidemiológico do suicídio a partir de base de dados construída em tese da FSP-USP

Victor Alexandre Percinio Gianvecchio e a orientadora, professora Maria Helena Prado de Mello Jorge, professora Sênior da FSP-USP. Imagem: Arquivo Pessoal

O suicídio é um grave problema de saúde pública mundial, afetando pessoas de quase todas as idades e acarretando elevados custos econômicos e sociais. O tema, de especial importância no contexto da pandemia de COVID-19, foi abordado na tese de doutorado intitulada “Suicídio no Estado de São Paulo: aspectos epidemiológicos e possíveis fatores de risco”, recém-defendida por Victor Alexandre Percinio Gianvecchio, pelo Programa de Pós-graduação em Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da USP.

O trabalho inova ao construir um banco de dados a partir de Boletins de Ocorrência Policial (BO) e também de laudos necroscópicos e toxicológicos do Instituto Médico Legal (IML). Com isto, foi possível detectar uma subnotificação 7,5% nos dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, além de avançar no entendimento das circunstâncias e características do suicídio. Foram obtidos 2.469 casos, projetando taxa de 6,6 por 100 mil habitantes, valor 7,5% maior do que os dados do SIM/MS (2.297 casos) para a mesma área e ano.

“Os resultados mostraram um aprimoramento da informação nos casos de suicídio, demonstrando a importância de trabalhar conjuntamente os dados provenientes das Declarações de Óbito, dos Boletins de Ocorrência Policial e do IML. Ou seja, foi possível estimar o ganho para o SIM/MS gerado por esse “relacionamento” com os dados da Segurança Pública, caso isso se tornasse um processo rotineiro nos registros de suicídios”, afirma o pesquisador, que é médico legista responsável pelo Laboratório de Toxicologia do IML e professor de Medicina Legal e Bioética do curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Para o pesquisador, “conhecer melhor o perfil epidemiológico do suicídio é a melhor maneira de pensar e implementar políticas públicas baseadas em evidências, o que ajuda a melhorar a prevenção dessa fatalidade”, afirma.

Segundo Gianvecchio, “a subnotificação ocorre porque, em relação às causas externas, o SIM/MS é alimentado pelas Declarações de Óbito emitidas pelo IML, porém nem sempre o legista dispõe de dados do histórico dos Boletins de Ocorrência ou mesmo das informações dos serviços de saúde (caso a vítima tenha sido socorrida), dificultando a avaliação da causa jurídica do fato”.

Assim, o estudo mostra um novo panorama epidemiológico e traz a possibilidade de incluir novas variáveis consideradas como possíveis fatores de risco, razão pela qual se recomenda, fortemente, sua utilização como fonte complementar nos estudos relativos ao suicídio.

O trabalho é um estudo transversal descritivo a partir das bases de dados citadas e incluiu variáveis relativas às características da vítima, do evento, das lesões, da presença de álcool e/ou drogas no momento da morte e possível motivação para o suicídio, além da comparação com os dados do SIM/MS. O estudo revela que o enforcamento representou 60,2% do total, seguido das autointoxicações (16,1%), precipitação de lugar elevado (9,3%) e arma de fogo (7,2%). Além disso, verificou uma queda de 92,5% entre os suicídios não especificados em relação ao SIM/MS, com consequente melhoria da qualidade dos dados.

Para a variável sexo, verificou-se uma predominância de suicídio entre homens em relação a mulheres, numa razão de 3,8. Quanto à idade, há ocorrência de suicídio desde os 10 anos de idade até os 97 anos de idade, sendo que a maior frequência ocorreu no grupo de 20 a 39 anos; as taxas foram mais elevadas no homem, principalmente idosos.

A maioria dos casos ocorreu na residência (74,1%) seguida de via pública. Quanto à distribuição geográfica, a taxa no interior foi a mais elevada (7,2), seguida do Município de São Paulo (6,2) e Região Metropolitana (5,6).

Os históricos da ocorrência de cada caso permitiram conhecer possíveis fatores de risco, como: transtornos mentais (39,4% dos casos, com destaque para depressão e uso/abuso de álcool e drogas), patologias (5,0%, principalmente em idosos), outros problemas (23,2%, sobressaindo-se o relacionamento pessoal, estar na prisão, problemas financeiros, no trabalho e os relacionados a perdas familiares) e tentativas anteriores de suicídio (10,0%).

Quanto aos exames toxicológicos, foram positivos em 51% dos realizados, sendo constatadas 902 substâncias. A maior ocorrência foi de álcool etílico (31,0%), destacando-se alcoolemia maior que 0,8 g/L (82,1%); o segundo grupo de substâncias correspondeu aos fármacos, onde a positividade nas mulheres foi quase três vezes em relação à encontrada nos homens. A cocaína foi constatada em 75 casos, pesticidas em 93 casos, e monóxido de carbono e gás liquefeito de petróleo em 20 casos.

 

Informações para contato: victorgianvecchio@usp.br