Imagem ilustrativa| Foto: Pixabay
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Enquanto muitos educadores buscam novos métodos de ensino para se adequar às mudanças constantes de um mundo conectado pela tecnologia, cada vez mais pais e professores apostam no caminho oposto: um retorno à educação clássica.

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O que se chama de educação clássica é simplesmente o que se chamava de educação até cerca de dois séculos atrás. Baseadas nos currículos das academias da Antiguidade (especialmente em Atenas e Roma) e da Europa medieval, as escolas clássicas rejeitam a noção de que a aprovação no vestibular é o critério mais importante de sucesso.

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Os defensores da educação clássica são pais e educadores insatisfeitos com o modelo contemporâneo. Por um lado, eles se preocupam com a crescente inclusão de bandeiras ideológicas de esquerda no currículo, como a chamada "identidade de gênero". Por outro, acreditam que uma educação voltada apenas para o mercado profissional não é capaz de ensinar o aluno a enfrentar as questões mais profundas da existência humana. E há sinais de que a procura desse modelo de ensino tem crescido, dentro e fora do Brasil.

O termo “educação clássica” por vezes é usado para definir modelos distintos. Mas, como regra, as instituições que adotam essa proposta costumam incluir o estudo de sete disciplinas fundamentais: gramática, lógica, retórica (Trivium), aritmética, geometria, astronomia e música (Quadrivium). A ênfase é na formação de alunos virtuosos, moralmente responsáveis - e não somente de profissionais capazes ou de pessoas que vão “transformar o mundo”.

Embora algumas escolas país afora já tenham adotado um modelo mais similar ao da educação clássica, elas são uma exceção. A maior parte dos cursos desse tipo ainda é oferecida de forma online. Por causa da falta de instituições presenciais com currículos clássicos, muitos pais adeptos desse estilo de educação acabam optando por ensinar os filhos em casa.

Mas a oferta de escolas nesse modelo deve aumentar nos próximos anos. Em Nova Santa Rita (RS), na região metropolitana de Porto Alegre, um projeto ousado tenta colocar de pé uma escola clássica completa para 450 alunos. O Instituto Cultural Hugo de São Vitor, uma entidade que atualmente oferece cursos online, já adquiriu um amplo terreno e planeja erguer uma escola nos moldes clássicos: o Colégio São José.

O projeto arquitetônico do prédio, com 12 mil metros quadrados de área construída, já está pronto. A iniciativa tem metas de curto, médio, e longo prazo. A previsão é de que a escola passe a funcionar em 2026 - ainda com a estrutura física incompleta. Quando estiver totalmente pronto (em 2031), o colégio terá uma torre de astronomia, ginásio, campo de futebol, pista de atletismo e até residências para professores.

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À frente do projeto, o professor Clístenes Hafner Fernandes afirma que é possível cumprir as exigências do Ministério da Educação e, ao mesmo tempo, ampliar o currículo para abarcar uma formação mais completa dos alunos. Para isso, as aulas serão em tempo integral. A escola oferecerá, além das disciplinas básicas, aulas de astronomia, retórica, canto Coral, marcenaria e latim. De acordo com Fernandes, a preparação dos professores já teve início.

Atuando na área educacional há vários anos, o professor tem percebido um aumento na procura da educação clássica. “Existe um interesse crescente pela educação clássica por parte dos pais, justamente por verem que, ao final da sua vida escolar, os seus filhos no máximo estarão preparados para prestar um exame do Enem ou um vestibular, e que isso não significa uma vida de cultura, uma formação integral em todas as dimensões humanas", afirma Fernandes.

Atualmente, o instituto está na fase de captação de recursos para tocar a obra. O custo da primeira fase é estimado em R$ 8 milhões.

Crescimento nos EUA

Nos Estados Unidos, as escolas clássicas têm se expandido rapidamente, e ainda assim não conseguem dar conta da demanda. Vivendo em uma cidade da Pensilvânia onde essa modalidade de ensino não estava disponível, o assistente administrativo Bill Brownlee decidiu mudar de estado - e de emprego. Agora, os seus cinco filhos frequentam a Hillsdale Academy, no interior do Michigan. Ligada ao Hillsdale College, uma faculdade de orientação conservadora, a escola é um exemplo de sucesso e passou a exportar seu modelo. Já são 41 escolas ligadas à Hillsdale Academy país afora, com 14.500 estudantes matriculados. Outros 8 mil alunos estão em listas de espera, já que as vagas não dão conta da demanda.

Os filhos de Brownlee aprendem latim, precisam decorar versos para recitar diante dos colegas e utilizam um uniforme com traços sóbrios. A escola também tem um campeonato de debates, orações diárias e eventos que valorizam os símbolos nacionais americanos.

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“O que me atrai na educação clássica é o fato de que o foco é fazer o aluno compreender ideias que são duradouras. Eles não são ensinados a última moda filosófica ou pedagógica”, diz ele. Brownlee acredita que o mau desempenho das escolas públicas americanas impulsionou a busca de escolas de perfil clássico (que, na maioria dos casos, são particulares). “A situação da educação nos Estados Unidos se tornou tão desagradável que muitos pais estão procurando outras opções”, afirma ele.

De fato, a pandemia de coronavírus - que modificou a rotina nas escolas públicas e interrompeu as aulas, em alguns casos, por mais de um ano - levou um número maior de pais a repensar suas escolhas educacionais. Muitos optaram pelo homeschooling (ensino domiciliar) - o número saltou de 3,3% para 16% entre a população negra durante a pandemia, de acordo com o órgão do governo americano responsável pelo Censo. Outros procuraram escolas de perfil clássico.

Diretor de uma editora que produz livros para escolas clássicas, Christopher Perrin afirmou que a procura do material aumentou 82% desde 2019. A escola online mantida pela companhia, a Scholè Academy, teve um aumento de 155% na procura no mesmo período.

A pandemia pode ter acelerado a expansão das escolas clássicas, mas - a julgar pelo nível de satisfação dos pais - há boas razões para crer que essa tendência vai continuar no longo prazo. “As crianças adoram ir à escola, amam aprender, e estão rodeadas por pessoas que também amam aprender e ensinar. Eu não poderia pedir por nada melhor”, diz Bill Brownlee.

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