No interior, cidades menores atraem multidões com fogueiras gigantescas

Em Pirapozinho (SP) e Jateí (MS), torre com labaredas chega a 50 metros

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Emerson Voltare
São Paulo

Se Caruaru (PE) e Campina Grande (PB) disputam o título dos maiores arraiais de São João do país, pequenas cidades a milhares de quilômetros ao sul do agreste nordestino brigam pelo feito da maior fogueira das festa juninas brasileiras.

O recorde de 62,2 m, registrado em 2010, ainda pertence a São João, no sudoeste do Paraná. A cidade de 10,5 mil habitantes, porém, está fora da disputa deste ano: a crise financeira transformou a queima em homenagem a são João Batista bienal desde 2017. Após a festa no passado, a próxima será em 2020. 

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Fogueira de São João em Pirapozinho, interior do estado (SP) - Divulgação

Já em Pirapozinho (SP) não parece faltar dinheiro nem animação. Os quase 25 mil habitantes comemoram o padroeiro são João há 31 anos. A prefeitura local estima gastar R$ 500 mil nas festividades.

A cidade, vizinha a Presidente Prudente, no oeste de São Paulo, porém, queimará a fogueira somente no dia de são Pedro, 29 de junho. Até lá, atrações como Matogrosso e Mathias, Michel Teló e Maiara e Maraisa animarão a comilança das quase 10 mil pessoas esperadas diariamente.

A família de Luciene Ortolan da Costa, 54, participa desde a primeira edição. Vem de Fernandópolis, a 325 km, uma semana antes. 

“Fabrico e vendo cocadas desde os 17 anos. Faz 12 que venho para cá sozinha, depois que perdi meu marido. Mas aqui segue uma alegria para mim”, diz a comerciante, que estima vender, ao todo, 40 mil guloseimas.

Pirapó, como é chamada por moradores, já teve a maior fogueira do Brasil, de 50 m. A altura é a mesma, mas só lhe confere o recorde estadual. O nacional cabe à pequenina Jataí, de 4.000 habitantes, perto de Dourados (MS).

Em sua 42a. edição, a festa em homenagem ao padroeiro são Pedro, o terceiro da tríade das festas juninas brasileiras importadas de Portugal, espera receber 50 mil visitantes para acompanhar shows como das duplas Edson e Hudson e Munhoz e Mariano.

Além da grande fogueira feita de eucaliptos de reflorestamento, conforme manda a legislação, promete espocar 162 mil fogos de artifícios. A administração local estima gastar até R$ 500 mil.

O servidor municipal Francisco Raimundo Filho, o Chico Lampião, 55, ajuda na montagem da fogueira desde a primeira vez. Hoje ele coordena uma equipe de sete montadores, que leva 40 dias para deixá-la pronta. “Era jovem e a fogueira, pequenina. Casei, tive três filhos, descasei, outros dois 
netos, casei de novo e cá estou.”

Duas cidadezinhas no sul de Minas Gerais também abrigam fogueiras gigantes em Ingaí (2.700 habitantes), a 30 km de Lavras, e Cachoeira de Minas (11,5 mil habitantes), quase na divisa com o Vale do Paraíba paulista.

Se Ingaí, não tem hoje a maior delas, limitando-se a 40 m, celebra a mais antiga das festas. Recebeu neste fim de semana 20 mil pessoas para sua 87ª edição, com shows sertanejos, comida típica e custo estimado de R$ 250 mil.

Se a fogueira não é a mais alta do país, é a mais “recheada”, dizem os moradores. Na maioria das cidades a estrutura é montada para queimar nas laterais do quadrado de toras de eucalipto. A de lá é preenchida com lenha. Logo depois da procissão e da missa do fim da tarde deste domingo, 23, foi acesa a fogueira e feita a queima de fogos.

“A festa de são João ganhou força aqui em 1931, quando um raio queimou uma casa e parte da igreja do então distrito de Lavras. Devotos fizeram uma promessa de acender uma fogueira a são Batista para livrar o local das trágicas intempéries”, conta o professor de história e morador local Canísio Moreira, 49.

Cachoeira de Minas, como Jateí, não queima fogueira para são João, mas para são Pedro. A tradição criada por fiéis em 1958, com fogueiras que logo nas primeiras décadas chegavam a 6 m, resiste. Teve seu auge com 40 m, recorde nos anos 1980. Questões orçamentárias e de segurança a reduziram para 30 m.

A festa lá aposta mais nas comidas típicas e no clima familiar, com destaques para as barracas de broa de pau a pique, quentão, canjiquinha doce e disputa de quadrilhas.

Espera-se que ao menos 5.000 pessoas passem pelo local até o próximo sábado (29).

Nem todos, porém, aprovam a grandiosidade das festas de hoje. Maria do Carmo de Vasconcelos, 71, moradora contemporânea do viajante mascate Pedro da Colodina, que aparecia em junho na cidade para vender seus produtos e patrocinava os primeiros festejos, preferia os encontros de antigamente. 

Usadas pelos cristãos para propagar a religião quando o cristianismo foi oficializado pelo Império Romano no século 4, as festas de são João foram trazidas do hemisfério norte, onde coincidiam com a colheita de início de verão, pelos portugueses para catequizar índios e negros. 

Em Portugal, as Festas dos Santos Populares abrigam arraiais com fogos de artifício, sardinha assada e música. 

A fogueira vem da crença cristã segundo a qual Isabel, mãe de João e prima de Maria, teria usado um sinal de fumaça para avisar parentes distantes de sua gravidez milagrosa em idade avançada.

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