Videoconferência é a nova justiça? - Espaço Vital

Videoconferência é a nova justiça?

Charge de Gerson Kauer
Videoconferência é a nova justiça?
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Por Carlos Alberto Bencke (OAB/RS nº 7.968) - [email protected]

Alguns operadores do Direito estão surpresos e receosos da repercussão no relacionamento com os magistrados, com o anúncio de que o trabalho em escritórios de casa possa ser adotado como regra no Judiciário gaúcho. O trabalho remoto durante a pandemia habituou juízes e desembargadores a ficarem em casa, recebendo, inclusive, advogados apenas por videoconferência, ou nem por este modo, mas por telefone.

A história parece estar-se repetindo.

Década de 1990, tomei posse como juiz de alçada pelo quinto constitucional da advocacia. Primeira pergunta que fiz ao saudoso José Ernesto Flesch Chaves, então presidente da Corte: “Onde é o meu gabinete?”

Não tinha, todos trabalhavam em casa, exceto talvez meia dúzia (dentre 73 juízes) que possuíam instalações precárias no 10º andar do distante Foro Central.

Não havia, óbvio, videoconferências, acesso remoto aos votos, processo eletrônico para manejo rápido, telefones celulares, nada disso. Processos físicos, votos feitos na maioria em máquinas de escrever caseiras e um intenso tráfego de processos por meio de malotes rotos e sujos que eram trazidos para a casa dos magistrados ou levados das suas residências duas vezes por dia. Ou mais, se acaso surgisse alguma liminar urgente.

Tudo foi resolvido com a construção do novo prédio do Tribunal de Justiça, dando-se gabinete a cada um dos desembargadores. Isto aconteceu no início da década de 2000.

Portanto, não é novidade para o Judiciário gaúcho tal tipo de trabalho caseiro.

Compreende-se que hoje em dia, na era de assessores e secretários apresentando sugestões de votos, é necessário dar destaque certos pontos de determinados processos ao próprio magistrado, pessoalmente, por si próprio.

Este contato deve ser olho no olho, sentindo - cada um dos protagonistas do encontro - as reações do outro. O mesmo se dá em sustentações orais presenciais. O advogado fala da tribuna e vê a reação dos julgadores e estes, por sua vez, enxergam a segurança ou titubeio do causídico ao relatar determinado fato.

Já a videoconferência torna o contato frio, distante, desnaturado de seus propósitos.

Certa vez ouvi de um magistrado que, quando recebia advogados, ele se sentia pressionado. O também saudoso desembargador Márcio Puggina, que estava ao lado, atalhou e disse mais ou menos assim: “Pressionados ainda são os advogados, que não sabem explicar aos seus clientes os porquês da demora dos processos, por que não se pode falar com o juiz, por que, por que, por que...

Os tempos são outros, certo. Mas, alguma solução intermediária deve ser encontrada e, para isso, é necessária a intervenção de órgãos de classe, como a OAB e a AJURIS, em nível regional, ou até a Ordem Nacional e a Associação de Magistrados Brasileiros.

A pandemia alterou hábitos, criou costumes, trouxe novas experiências. Temos de encarar tudo isso com parcimônia e pensar novos caminhos para não deturpar o verdadeiro objetivo da Justiça: fazer justiça!