A cultura negra: luta e resistência de um povo

Afoxé, capoeira, samba de roda e os blocos afros são exemplos das manifestações culturais do povo negro brasileiro

Por Lorena Carneiro e Wesley Lima, do Brasil de Fato
 
 

Milhares de pessoas se reúnem durante as festas populares e religiosas, como o Dia de Yemanjá, comemorado no dia 2 de fevereiro. / Lucas Mascarenhas

A história brasileira é marcada por vários episódios de luta popular em defesa de direitos, que garantem dignidade, respeito e, acima disso, a vida. É neste contexto, que o povo negro, vítima da diáspora que os retirou do seu continente de origem – África -, conduziu o enfrentamento cotidiano na defesa de todas as dimensões sociais e culturais que reafirmam o lugar de protagonismo na construção de uma identidade e representatividade social.Na Bahia, estado brasileiro cuja população é majoritariamente composta por negros e negras, a professora Railma Souza explica que a resistência passa, em primeiro lugar, pelo enfrentamento à visão eurocêntrica. “Infelizmente, ainda enchemos a boca para dizer que pessoas cultas são as que ouvem alguns tipos de música, leem muitos livros […] o que constitui uma hierarquização da cultura”, pontua.Nesse sentido, Railma considera fundamental romper com essas noções estereotipadas e tentar compreender a complexidade das expressões da cultura do povo negro, do povo indígena, rural, periférico. “Enxergar a poesia de rua como poesia, o reggae, o rap, o hip hop, o funk e mesmo o pagode enquanto estilos musicais”, explica.

Ao compreender essas questões, a yalorixá Jaciará Ribeiro, afirma que o racismo tem matado homens, mulheres, jovens e o processo de organização e valorização do candomblé, enquanto um instrumento de resistência e reafirmação de uma identidade de luta, tem trabalhado no resgate da autoestima, no acolhimento de famílias, jovens e mulheres. “Somente com os terreiros de candomblé, quilombolas e de resistência, que teremos o compasso para continuarmos lutando”, reflete Jaciará.

Arte que faz luta

Um exemplo desse processo de resistência e do papel histórico que as lutas antirracistas possuem, os afoxés, têm protagonismo por serem uma manifestação artístico-religiosa vinculada às práticas do candomblé. Segundo o projeto Afreaka, essa foi a primeira manifestação negra a desfilar pelas ruas da Bahia, em 1885. Dentre os afoxés mais tradicionais baianos estão o Filhos de Gandhy, em Salvador, e o Filhos da Luz, em Feira de Santana.

Importante destacar também a capoeira, originada no século XVII, desenvolveu-se como uma estratégia dos povos africanos escravizados para cultivarem a sociabilidade e lidarem com a violência do período escravista, presente em todo o território nacional e em mais de 160 países, segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); e o Samba de Roda do Recôncavo Baiano, que é reconhecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, por ser uma das expressões musicais, coreográficas, poéticas e festivas mais importantes de nossa cultura.

Uma festa que mobiliza multidões de todo estado é a “Boa Morte”, que é organizada pela Irmandade da Nossa Senhora da Boa Morte, confraria que reúne apenas mulheres negras e que surgiu nas primeiras décadas do século XIX, em Salvador, e depois migrou para Cachoeira, no Recôncavo.

Ao problematizar o papel político dessas manifestações artísticas, Ivannide Santa Bárbara, do Movimento Negro Unificado (MNU), destaca que o racismo promove uma “folclorização” da cultura negra: “os racistas nos veem como pessoas folclorizadas, fantasiadas mesmo. Viramos objeto de observação, como se fossemos vitrines, e não pessoas comuns que se assumiram como são dentro das suas origens”.

Neste contexto, Hely Pedreira, professora de escolas em áreas quilombola de Feira de Santana, fala sobre a Lei 10.639/03, que trata do ensino da História e Cultura Africana e Afro-brasileira nas escolas como uma conquista, ainda que tenha seus limites. Para ela, a cultura tem um importante papel na sala de aula. “Com certeza a questão cultural é um aliado de muito peso, pois traduz a questão identitária dos sujeitos e suas representações. Acredito que a valorização cultural pode ser a ponta de lança na efetivação de uma educação que emancipa e empodere os seus sujeitos”, afirma.

+ sobre o tema

Oliveira Silveira: Um dos idealizadores do 20 de Novembro

Junho de 2008. Eu estava na recepção de um hotel no...

Eliana Pittman

Eliana Leite da Silva ,nasceu no Rio de Janeiro(RJ)...

CAJAZEIRAS: Semana da Consciência Negra

Fonte: Jornal Folha VIP Cajazeiras -   A...

Veja a repercussão da morte do ex-campeão Muhammad Ali

A morte de Muhammad Ali nesta sexta-feira (3), um...

para lembrar

Filme de Claudinho e Buchecha, Nosso Sonho é maior bilheteria nacional de 2023

Filme que conta a história de Claudinho & Buchecha, Nosso Sonho se...

Maduro eleito com 50,6%. Chávez é vitorioso

Eleição de Nicolás Maduro projeta a continuidade de regimes...

Em documentário, Beyoncé diz que música ajudou a superar aborto

Em nota publicada neste sábado (26), o jornal "USA...

IZA, Ciara e Major Lazer arrasam no deserto em clipe de Evapora; veja

A brasileira IZA juntou forças com Ciara e Major...
spot_imgspot_img

Mulheres sambistas lançam livro-disco infantil com protagonista negra

Uma menina de 4 anos, chamada de Flor de Maria, que vive aventuras mágicas embaixo da mesa da roda de samba, e descobre um...

Juçara Marçal e Rei Lacoste lançam o Amapiano “Sem contrato”

A dupla Juçara Marçal (Rio de Janeiro) e Rei Lacoste (Bahia) lançam nesta sexta-feira (26) o single “Sem Contrato” nas principais plataformas digitais e...

Podcast brasileiro apresenta rap da capital da Guiné Equatorial, local que enfrenta 45 anos de ditadura

Imagina fazer rap de crítica social em uma ditadura, em que o mesmo presidente governa há 45 anos? Esse mesmo presidente censura e repreende...
-+=