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Estadão em parceria com Rolex
Como uma herança compartilhada protege florestas da Costa do Marfim Reduto de biodiversidade ganha sobrevida a partir do trabalho do primatologista Inza Koné em parceria com as comunidades locais
Inza Koné, laureado do Prêmio Rolex de Empreendedorismo, e Freddy Gnandet, responsável por um viveiro de plantas na vila de Dohouan, no sudeste da Costa do Marfim

Tanoé-Ehy é uma das poucas florestas nativas que sobraram na África Ocidental, após a desenfreada atividade humana na região. O bioma, no extremo sudeste da Costa do Marfim, perto da fronteira com Gana, cobre apenas 2% do território marfinense, mas abriga uma exuberante biodiversidade. Aproximadamente 45 espécies endêmicas já foram registradas naquele espaço. Existe a chance, inclusive, de que a floresta abrigue ainda exemplares do colobo-vermelho de Miss Waldron, espécie de primata registrada pela última vez nos anos 1970.

Assim como ocorre na Amazônia brasileira, na reserva de Mamirauá, a história da sobrevivência de Tanoé-Ehy tem muito a ver com o trabalho de um primatologista. Inza Koné, o primeiro estudioso de primatas marfinense, orquestra, em conjunto com 11 comunidades locais, uma grande rede de proteção à floresta. O cientista é um dos laureados do Prêmio Rolex de Empreendedorismo 2023, uma das ações que fazem parte da Iniciativa Perpetual Planet da marca e que reconhece o trabalho de indivíduos que têm a coragem e a determinação de enfrentar grandes desafios.

Koné durante um workshop de estratégia de conservação com colegas e representantes das comunidades locais

No Brasil, José Márcio Ayres, falecido em 2003, também recebeu o mesmo prêmio no passado, por criar uma reserva de desenvolvimento sustentável que protegesse as comunidades tradicionais e o uacari-branco, espécie de macaco encontrada exclusivamente nas florestas alagáveis da Amazônia.

À esquerda, vista aérea de uma plantação de dendezeiros cortada na Floresta Tanoé-Ehy. À direita, o encontro do Rio Tanoé com a Lagoa Ehy

No caso da África, a situação atual é semelhante à encontrada por Ayres na virada do século no Brasil. “Algumas das espécies de macacos que correm o maior risco de extinção em toda a África Ocidental vivem naqueles 11 mil hectares de terreno pantanoso”, afirma Koné.

O especialista marfinense criou o programa de conservação das cada vez mais sufocadas espécies da fauna e da flora de Tanoé-Ehy em 2006. O projeto conseguiu evitar planos externos que previam a plantação de dendezeiros e, em 2021, a floresta foi oficialmente declarada uma reserva natural gerida pela comunidade local. Koné acredita que a participação ativa das pessoas da região tenha sido primordial para o sucesso da iniciativa: “Onze vilarejos uniram forças para preservar uma herança compartilhada”.

Koné e o primatologista André Koffi observam imagens de armadilhas fotográficas

Os antigos caçadores ilegais, que conhecem a área como muito poucos, abandonaram suas antigas atividades e também entraram para o time da proteção ambiental. “Esses antigos caçadores têm um conhecimento que nem mesmo os melhores cientistas do mundo têm”, explica Koné. O trabalho estruturado pelo primatologista com a população envolve algumas frentes e um dos pilares é o treinamento em monitoramento ambiental. Ao ensinar os moradores da floresta a utilizar drones, coletar DNA e construir armadilhas fotográficas, Koné espera que as próprias comunidades consigam, em breve, fazer a autogestão da floresta. Protegendo e vivendo dela. “Estamos ajudando a reconciliar homem e natureza, para que os humanos e a vida selvagem possam viver em perfeita harmonia”, diz ele.

O plantio da mandioca é uma das atividades sustentáveis que vêm demonstrando bons resultados, segundo Koné. Por causa do uso de equipamentos modernos e da construção de uma pequena usina de processamento, a renda proveniente do cultivo da raiz já melhorou consideravelmente nos 11 agrupamentos de Tanoé-Ehy. Koné e sua equipe também criaram um jardim botânico para fins educativos em todos os vilarejos, estabeleceram viveiros naturais para separar a floresta das regiões de cultivo e plantaram mais de 10 mil árvores nativas para reflorestar a região que circunda as comunidades.

À esquerda, as trepadeiras que são perfeitas para os primatas, pois ajudam a unir as árvores. À direita, Mike Miankweku, guia florestal e membro da equipe de Koné, instala uma armadilha fotográfica

Com o prêmio recebido pela Rolex, o primatologista poderá expandir o projeto. Segundo ele, o próximo passo será tentar extrapolar as iniciativas bem-sucedidas na Costa do Marfim para o território de Gana, uma vez que a natureza não obedece às fronteiras políticas criadas pelos seres humanos. O bioma típico de Tanoé-Ehy também se estende para a nação vizinha.

Fotos: Nyani Quarmyne/Rolex

Confira os vídeos do projeto:

Prêmio Rolex de Empreendedorismo 2023: Inza Koné – O Tesouro da África Ocidental

Prêmio Rolex de Empreendedorismo 2023: Inza Koné – De Caçadores Furtivos a Protetores

Prêmio Rolex de Empreendedorismo 2023: Inza Koné – De volta às raízes