Com mais um feriado bem no meio da semana, o tempo vai ficando curto para a aprovação da reforma tributária, mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está otimista e até melhorou o humor, que andava mal depois de duas puxadas de tapete do chefe Lula por causa do déficit zero. Segundo Haddad, a “espinha dorsal” da reforma é consensual e tem tudo para ser promulgada ainda neste ano, mas “uma coisa ou outra” vai sobrar para o ano que vem.
Em conversa com a coluna, Haddad chamou a atenção para dois tipos de emendas na Câmara, as supressivas e as modificativas. Se os deputados suprimirem trechos incluídos pelo Senado, esses trechos deixam de existir e não interferem na promulgação. Se houver emendas modificativas, e certamente haverá, promulga-se o principal e empurra-se o resto para o Senado e para mais adiante.
Esse é o formato do tal “fatiamento” que vem sendo acordado entre Planalto, Fazenda, Câmara e Senado e que pode ser resumido de forma simples: o principal é concluído em 2023 e o que é polêmico, espinhoso e naturalmente demorado é empurrado para 2024. O setor econômico, o financeiro e o político concordam que, mesmo assim, já é uma baita vitória aprovar uma reforma tributária que foi postergada por décadas.
A “espinha dorsal”, não custa lembrar, visa menos burocracia, mais transparência e menos sonegação, com a transformação de cinco impostos em dois. PIS, Cofins e IPI vão se fundir num só, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), federal, a ser arrecadada pela União. ICMS, estadual, e ISS, municipal, serão fundidos no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com gestão compartilhada por Estados e Municípios. E esse, aliás, é um dos problemas, forte candidato a emendas modificativas.
A ideia original do governo e, portanto, da Fazenda, era a criação de um Comitê Federativo. O nome acabou mudando para Conselho Gestor do Fundo de Desenvolvimento Regional, mas o problema continuou. Os Estados do Sul, Sudeste, Norte, Nordeste e Centro-Oeste não se entendem sobre os critérios de partilha. Afinal, todos querem mais para eles, menos para os outros. Como desatar esse nó?
Já os alvos de emendas simplesmente supressivas devem ser, de um lado, as benesses, ou seja, as subvenções e impostos mais camaradas – como as concedidas à indústria automobilística no Nordeste -- e, de outro, o aumento de impostos em setores que têm muito poder de lobby e não estão acostumados a ceder facilmente – como os responsáveis por produtos considerados nocivos à saúde e ao ambiente.
“O setor beneficiado fica feliz, o que não se sente beneficiado briga”, diz Haddad, resumindo num linguajar coloquial uma questão complexa, que exige muita negociação. De qualquer forma, ele não só está satisfeito e otimista, como faz questão de dividir os louros, ou “o troféu”, como diz, com a Câmara e o Senado. Além de elogiar os presidentes Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, ele também cita os relatores, Aguinaldo Ribeiro (PP-PI) na Câmara e Eduardo Braga (MDB-AM) no Senado.
Leia também
“Não adianta tirar o mérito da grande política. Se eles (presidentes e relatores) não quisessem, nada andava. O Arthur, por exemplo, comprou a agenda econômica, a agenda do País”, diz o ministro, em fase de namoro com o Congresso – e com pressa.
Quanto à votação apertada no Senado, por 53 a 24 – apenas quatro a mais do que os 49 votos necessários para a aprovação --, ele prefere olhar sob outra ótica: “O Brasil está dividido ao meio, mas o bolsonarismo mostrou que não tem nem 1/3 do Senado, muito menos os 3/5 exigidos para aprovar emendas à Constituição”. Bem... pelo menos na reforma tributária, que não é questão de esquerda e direita, oposição e governo, mas sim uma necessidade antiga e uma exigência do País, até do bom senso. O atual arcabouço tributário brasileiro é absolutamente insuportável.