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COLUNISTAS

O inevitável movimento de renovação no áudio

29/04/2022 - 00:58h
Atualizado em 29/04/2022 - 10:39h

Fotos: Freepik.com / Rawpixel.com

 

Não há como negar  que de 30 anos para cá o perfil do entusiasta do áudio profissional mudou completamente. Nos anos de 1990 quando começaram a surgir as primeiras publicações sobre o áudio profissional, as revistas falavam de um mundo distante de equipamentos e recursos geralmente utilizados no seguimento de PA (publicadress). Pouco se falava sobre processos realizados nos estúdios pois essa área era dominada por poucos estúdios ligados às Majors (gravadoras multinacionais). Em geral as publicações falavam sobre periféricos, consoles, eletrônica e um pouco sobre acústica. Não havia computador no áudio, e por isso não se discutia DAWs ou plugins.

Uma década depois as publicações começaram a ensaiar artigos sobre o uso das DAWs e alguns plugins. Nessa época o grande interesse público começou a ser como gravar e mixar com uma plataforma conhecida como Protools. Não sei se todo jovem de hoje sabe, mas no início o acesso ao software Protools era restrito para quem podia comprar o hardware da digidesign. Messa época quem não tinha uma Didi001 tinha que usar Cakewalk, SoundForge, Samplitude e Nuendo. Dali para frente, os periféricos e equipamentos foram esmaecendo nas publicações e só se falava sobre como gravar, mixar e masterizar no Home Studio. Inclusive Home Studio passou a ser a palavra mais ouvida no círculo do áudio a partir de então. Tudo era possível na sua casa, com alguns equipamentos e um Intel Pentium. Essa hegemonia do “estúdio de silício” durou bem até 2012, quando o sentimento “oldschool” voltou à tona e os periféricos, consoles analógicos empoeirados, ou novos passaram a tomar o espaço dos computadores, prometendo separar os "adultos" das "crianças". Talvez maior que a querela entre estúdio e home studio, foi a analógico e digital. A disputa entre analógico e digital tirou o sono de muita gente nos últimos anos, e trouxe  a ilusão de que é necessário fazer uma escolha certeira no início da carreira.

 

Carlos Miranda, um sábio

Um dia recebi um convite para mediar um painel sobre Produção Musical no FEBRE (Festival & Conferência de Música de Sorocaba)  e entre os convidados estavam, Carlos Miranda, Gui Jesus (Risco) e Gustavo Ruiz. Foi um choque quando perguntei ao Miranda sobre como ele começou a produzir bandas e ele respondeu "eu falei que era produtor para uma banda e eles acreditaram". A plateia ficou perplexa, certamente mais da metade eram estudantes de áudio ou produção fonográfica e a resposta dele foi ficando ainda mais constrangedora. Em seguida ele complementou dizendo que foi produzindo o disco da primeira banda somente no feeling, na intuição e utilizando os técnicos de estúdio como ferramenta das suas ideias e que realmente conseguiu entender qual era a função do produtor musical depois do quinto disco. Foi além, chocando toda a plateia e os convidados dizendo que não entendia nada de mixagem masterização, entendia de artista e público e que mesmo dormindo nas sessões de gravação ele sabia se uma nota estivesse fora de lugar. Tudo que um aluno não quer ouvir! Mas o saudoso Miranda foi um homem sábio e experiente que construiu sua carreira produzindo em grande quantidade, se expondo ao erro e colecionando os acertos. Quer dizer então que é isso? Não precisa estudar? Pelo contrário, ele ficou muito entusiasmado com a ideia de um curso com um estúdio de grande porte que pudesse além de oferecer a teoria, permitisse ao aluno trabalhar diariamente nas produções do estúdio.

 

 

As novas gerações e os novos interesses

O fato é que de 10 anos para cá o perfil do aluno mudou. Daws, plugins, dicas e truques não fazem mais brilhar os olhos dos jovens aprendizes. Constatei isso na minha participação da aula com alunos do primeiro semestre. Houve um tempo que o alunado era mais velho, pessoas que trabalharam por décadas nas empresas de som e procuravam um diploma, depois vieram os aficionados por Home Studio e suas Daws com equipamentos baratos querendo o milagre da multiplicação sonora e agora o que se vê é uma grande quantidade de jovens artistas, que na sua grande maioria já entendem o suficiente de áudio mas querem saber como chegar até o público com sua música. O encantamento com os equipamentos dura o suficiente para saber que sem bons projetos artísticos toda experiência musical vai parar numa gaveta. Isso tornou as coisas muito mais fáceis para nós professores, os alunos vêm mais focados e em autoproduzir e não em procurar um emprego.

 

Viver de Música/Viver do áudio

Pode parecer um choque de realidade para muita gente, mas não vai adiantar ser um “ás” do Home Studio ou o mestre dos “tipsand tricks” da mixagem.  Não tem emprego pra todo mundo no mundo do áudio! Para falar bem a verdade, (e aqui vai minha opinião pessoal) ser bom no áudio não é mais que uma obrigação. Áudio não é o fim, é o meio e se você gostaria de ser “artista”, quem sabe a solução seria fazer arte de verdade. No país onde vivemos, o artista é o que empreende, o que banca, o que seduz o público e o que se diverte. Não tem lugar cômodo para o artista, é uma busca infinita. Todas as grandes referências do áudio que você certamente conhece são grandes artistas, são comunicadores, falam bem e tem um ótimo relacionamento com o público. Quando você  percebe já é um fã com carteirinha assinada implorando para pagar por um curso, uma consultoria ou uma conferência. Então quando vejo essas grandes referências do áudio certamente eles são o que são porque fazem arte com seu ofício e, por isso, estão ali sempre se “apresentando” para o público.

 

 

Os bons ventos da mudança

Por incrível que pareça, o perfil do alunado ingressante em Produção Fonográfica mudou. Ao contrário do passado, cada vez é maior o número de mulheres dominando o áudio e fazendo fluir esse ofício para o auxílio da arte. Não é raro perguntar para um aluno qual o motivo dele estar no curso e a resposta ser: “eu quero aprender a produzir e lançar a minha música, a minha arte”. Para mim isso é um alento. Talvez um tanto frustrante para os aficionados dos dados, marcas e modelos, mas a nova geração de produtores fonográficos parece estar muito mais interessada em fazer a arte chegar ao público do que mexer em botões ou “tirar um supersom de guitarra”.  Até porque não tem nada que simbolize mais o franco declínio do modelo tradicional de fazer música, que a iminente falência das grandes marcas de guitarras e baixos. Mas isso é assunto para um outro artigo.

 

Até a próxima!

O inevitável movimento de renovação no áudio
José Carlos Pires

COMENTÁRIOS

O capacitor envelhece em um equipamento pouco usado também? Ou ele degrada principalmente com o uso? Por exemplo, um equipamento da década de 80 muito pouco usado precisaria de recap por desgaste do tempo?

- Henrique M

Ótimo, vai ajudar muito! Cesar é fantástico, ótima matéria!

- adriano vasque da

Saudades da Paranoia saudável que tínhamos no Freeeeeee Jazzzzzz Festival (imitando Zuza em suas apresentações magnificas) Parabéns Farat Forte abraço

- Ernani Napolitano

Artigo incrivel! Extremamente realista e necessário, obrigado mestre!

- Jennifer Rodrigues

Depois de 38 anos ouvindo o disco, eis q me deparo com a história dele. Multo bom!! Abrss

- Fernando Baptista Junqueira

Que maravilha de matéria, muito verdadeira é muito bem escrita, quem viveu como eu esta época, só pode agradecer pela oportunidade que Deus me concedeu. Vou ler todas, mas tinha que começar por esta… abraços…

- Caio Flávio

Só li verdades! Parabéns pela matéria Farat

- Guile

Ótimo texto Zé parabéns !!!!! Aguardando os próximos!!!

- Marco Aurélio

Adoro ver e rever as lives do Sá! Redescobri várias músicas da dupla valorizadas pela execução nas "Lives do Sá". Espero que esse trabalho volte de vez em quando. O Sá, juntamente com o Guilherme Arantes e o Tom Zé, está entre os melhores contadores de casos da MPB. Um livro com a história da dupla/trio escrito por ele seria muito interessante!

- Bruno Sander

Ontem foi um desses dias em que a intuição está atenta. Saí a caminhar pela Savassi sabendo que iria entrar naquela loja de discos onde sempre acho algo precioso em vinil. Já na loja, fui logo aos brasileiros e lá estavam o Nunca e o Pirão de Peixe em ótimo estado de conservação, o que é raríssimo. Comprei ambos. O 2º eu já tinha, meio chumbado. O Nunca eu conhecia de CD, e tem algumas das músicas que mais gosto da dupla, p. ex. Nuvens d'Água (acho perfeita), Coisa A-Toa (alusão à ditadura?), e outras. Me disseram que o F. Venturini é fã do Procol Harum, e realmente alguns solos de órgão dele fazem lembrar a banda inglesa.

- João Henrique Jr.

Que maravilha de matéria. Me transportei aos anos de ouro da música brasileira

- Sidney Ribeiro

Trabalho lindão. Parabéns à todos os envolvidos!

- Anderson Farias de Melo

O que dizer do melhor disco da música nacional(minha opinião). Tive o prazer em ver eles como dupla e a volta como trio em um shopping da zona leste de sampa. Lançamento do disco outra vez na estrada. Espero poder voltar a vê-los novamente, já que o Sa hoje mora fora do Brasil. E essa Pandemia, que isolou muito as pessoas. Obrigado por vocês existirem como músicos, poetas e instrumentistas. Vocês são F..., Obrigado, abracos

- Luiz antonio Rocha

Que maravilha Querido Paulinho Paulo Farat!! Obrigado por dividir conosco momentos tão lindos , pela maravilha de pessoa e imenso talento que Vc sempre teve, tem e terá, sempre estará no lugar certo e na hora certa ! Emocionante! Tive a honra de trabalhar muitas vezes com Vc, em especial na época do Zonazul , obrigado por tudo, parabéns pela brilhante carreira e que Deus Abençõe sempre . Bjbj

- Michel Freidenson

Mais uma vez um texto sensacional sobre a história da música e dos músicos brasileiros. Parabéns primo e obrigado por manter viva a memória dessas pessoas tão especiais para nós E vai gravar o vídeo desta semana! Kkkk

- Carlos Ronconi

Grande Farat!!! Bacana demais a coluna! Cheio de boas memorias pra compartilha!!!

- Luciana Lee

Valeu Paulo Farat por registrar nosso trabalho com tanto carinho e emoção sincera. Foram momentos profissionais muito importantes para todos nós. Inesquecíveis ! A todos os membros de nossa equipe,( e que equipe! ) Nosso Carinho e Saudades ! ???? ???????????????????? Guilherme Emmer Dias Gomes Mazinho Ventura Heitor TP Pereira Paulo Braga Renato Franco Walter Rocche Hamilton Griecco Micca Luiz Tornaghi Carlão Renato Costa Selma Silva Marilene Gondim Cláudia Zettel (in memoriam) Cristina Ferreira Neuza Souza

- Alberto Traiger

Depois de um ano de empresa 3M pude fazer o bendito carnê e comprei uma vitrolinha (em 12X) e na mesma hora levei Pirão, Quatro (Que era o novo), Es´pelho Cristalino e Vivo do Alceu, fiquei um ano ouvindo e pirando sem parar, depois vi o show do Quatro em Campinas. Considero o mais equilibrado de todos, sendo que sempre pendendo pro rural e nem tanto pro urbano, um disco atemporal podendo ser ouvido em qualquer situação, pois levanta o astral mesmo. No momento, Chuva no campo é ''a favorita'', mas depois passa e vem outra, igualzinho à aquela banda de Liverpool, manja????

- Ademilson Carlos de Sá

B R A V O!!! Paulo Farat não esqueça: “Afina isso aí moleque!” Hahahaha Tremendo profissional, sou teu fã, Grande abraço!

- Dudu Portes

Show é sensacional. Mas a s sensação intimista de parecer que a live é um show particular, dentro da sua casa, do seu quarto, é impagável. Parabéns família, incluindo Guarabyra e Tommy...

- Ricardo Amatucci

Paulo Farat vai esta nas lives do Papo Na Web a partir de amanha apresentando "Os Albuns Que Marcaram As Nossas Vidas"" Não percam, www.facebook.com/depaponaweb todas as terças-feiras as 20:00 horas

- Carlos Ronconi

Caro Luiz Carlos Sá, as canções que vocês fazem são maravilhosas, sinto a energia de cada uma. Tornei-me um admirador do trabalho de vocês no final dos anos 1970 com o LP Quatro e a partir de então saí procurando os discos de vocês, paguei um preço extorsivo pelo vendedor, os LP's "Casaco Marrom" do Guarabyra e "Passado, Presente e Futuro" (primeiro do Trio), mas valeu. tenho todos em LP's e CD's até o Antenas, depois desse só em CD's e o DVD "Outra Vez Na Estrada" exceto o mais recente "Cinamomo" mas em breve estarei com ele para curtir. A última vez que vi um show da dupla (nunca vi o trio em palco), foi no Recife no dia 16/04/2016 na Caixa Cultural, vi as duas apresentações. Levei dois bolos de rolo pra vocês, mas o Guarabyra não estava. Quero registrar que tenho até o LP "Vamos Por Aí", todos autografados, que foi num show feito no Teatro do Parque, as apresentações seriam nos 14,15 e 16/10/1992 mas o Guarabyra perdeu o voo e só foram dois dias, no dia do seu aniversário e outro no dia 16. Inesquecível. Agora estou lendo essas crônicas maravilhosas. Grande abraço forte e fraterno e muita saúde e sucesso pra vocês, sempre. P.S. O meu perfil no Facebook é Xavier de Brito e estou lá como Super Fã.

- Edison Xavier de Brito

Me lembro de ter lido algumas destas crônicas dos discos quando voce as publicou no Facebook em 2013, Sá. Muito emocionante reler e me emocionar de novo. Voces foram trilha sonora importantíssima dos últimos anos da minha vida. Sou de 1986, portanto de uma geração mais nova que escuta voces. Gratidão e vida longa a voces!

- Luiz Fernando Lopes

Salve!!! Que maravilha conhecer essas histórias de discos que fazem parte da minha vida. Parabéns `à Backstage e ao Sá! E, claro, esperando a crônica do Pirão. Esse disco me acompanha há mais de quarenta anos! Minhas filhas escutaram desde bebês e minha neta, que vai nascer agora em setembro, vai aprender a cantar todas as músicas!

- Maurício Cruz

com esse time de referências musicais (exatamente as minhas) mais o seu talento, não tem como não fazer música boa!!!! parabéns!!! com uma abraço de um fã que ouve seus discos desde essa época!

- nico figueiredo

Boa noite amigo, gostei muito das suas explicações, pois trabalho com mix gosto muito mesmo e assistindo você falando disso tudo gostei muito um abraço.

- Rubens Miranda Rodrigues

Obrigado Sá, obrigado Backstage, adoro essas histórias, muito bom, gostaria de ouvir histórias sobre as letras tbém, abç.

- Robson Marcelo ( Robinho de Guariba SP )

Esperando ansioso o Pirão de Peixe e o 4. Meu primeiro S&G

- Jeferson

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